A Hora Mágica

Especial John Herbert

 

A Hora Mágica
Direção: Guilherme de Almeida Prado
Brasil, 1999.

Por Ailton Monteiro

Uma pena que um cineasta do gabarito de Guilherme de Almeida Prado não seja tratado com o devido respeito pela nossa “indústria”. A Hora Mágica (1999), um de seus filmes mais geniais e criativos, passou batido quando de seu lançamento nos cinemas e, infelizmente. nem ganhou uma edição em DVD, sendo possível vê-lo apenas numa péssima cópia distribuída na internet, ripada de uma exibição na televisão. E trata-se de um filme cuja qualidade plástica é necessária para uma melhor apreciação. Assim, sem poder vê-lo da melhor maneira possível, o que me restou foi ficar imaginando a maravilha que seria ver o filme na gloriosa tela grande. Mesmo assim, consegui apreciá-lo e ver o quanto é um grande trabalho.

O título “A Hora Mágica” aparece num cinema no final de A Dama do Cine Shanghai (1987), e o filme também fala de uma tal Dulce Veiga, que apareceria num filme que só seria concluído nove anos depois, Onde Andará Dulce Veiga? (2008), também restrito ao circuito alternativo e com poucas cópias distribuídas. Aliás, o próprio Almeida Prado, em seu livro Guilherme de Almeida Prado – Um Cineasta Cinéfilo, diz que não sabe fazer filmes populares. Em suas palavras, “meus filmes são do tipo que ninguém esperava ver ou, algumas vezes, nem queria ver”. Quer dizer, são filmes para um público bem específico, mais sofisticado, eu diria.


A Hora Mágica
é baseado num conto do genial escritor argentino Júlio Cortázar, e mostra um ator de novelas de rádio (Raul Gazolla) que sempre interpreta o papel de vilão. Ele também complementa a renda dublando um ator de voz péssima no cinema. O filme se passa num momento em que a televisão estava prestes a chegar ao Brasil e que o rádio é que era ainda o grande meio de comunicação de massa. Há um crime que acontece no apartamento vizinho e logo depois ele conhece uma moça que lhe escreve cartas de amor e por quem se apaixona (Júlia Lemmertz).

Os dois ficam juntos, mas ele começa a suspeitar que ela tem algo a ver com o crime. Mas o interessante é que isso só a torna mais interessante aos seus olhos. E realmente Julia Lemmertz nunca me pareceu tão bela quanto neste filme de Almeida Prado. E vale dizer que a trama é menos importante do que o modo como o cineasta resolve contá-la, de maneira bem diferente do que se costuma ver.

John Herbert interpreta um colega de trabalho do protagonista, o sujeito que sempre pega o papel de mocinho da trama e que mais recebe cartas das fãs. Maitê Proença faz um papel duplo, mas é José Lewgoy quem rouba a cena nos momentos em que aparece, interpretando vários papéis.  Imara Reis e Walter Breda, que trabalharam com o diretor em Flor do Desejo (1984), aparecem em papéis de pequeno destaque, e Tânia Alves abre o filme com sua voz cantando um tango e sua boca, cuja câmera destaca tão bem.

 

Ariella

Especial John Herbert

 

Ariella
Direção: John Herbert
Brasil, 1980.
 

Por Filipe Chamy 

 

Sem dúvida, a adolescência ainda é um bicho exótico nas artes. Assim como a infância, aliás. 

A transição para a vida adulta é geralmente encarada menos como uma condição do que como um “período de tempo”, em que simplesmente as pessoas “aguardam” chegar a um determinado estado (físico, grosso modo). 

Não que a juventude não seja uma época de mudança, realmente. Mas é bem mais do que isso. Assim como a vida adulta é mais complexa do que simplesmente uma pré-velhice, a adolescência também não deveria ser vista como um ensaio de anos futuros. 

Ariella ressente-se um pouco dessa incompreensão. É uma história sobre uma jovem, mas ela se assemelha mais a um fantasma que a um retrato honesto da adolescência. A jovem adolesce com muitas dúvidas, mas esse é um erro capital desta fita dirigida por John Herbert: seus questionamentos não são próprios da idade, mas da trama do filme. Não é natural e nem adequado considerando os rumos que a coisa toma: estragando um pouco a surpresa, digo apenas que há um segredo sobre a origem da garota, e seus sentimentos de isolação não advêm de reflexão ou desajuste, mas puramente por ela não ser de fato quem pensava que era, do jeito que pensava. É uma análise externa de sua personalidade, portanto, e esse estranhamento compromete bastante a estrutura do filme, que fica prensado num moralismo esquemático. 

Evidentemente, o auge desse convencionalismo se encontra na patética cena da revelação tão terrível a Ariella: o didatismo dos diálogos parece amador, até, ao falar explicitamente tudo que se passava com os personagens e seus segredos, tudo de que afinal o filme, a imagem, o som, não conseguiram dar conta. É tão absurdo que nem mesmo os intérpretes do filme parecem convencidos por esse artifício preguiçoso, e inclusive seus personagens estranham tantas revelações enfileiradas e denunciadas a troco de não se sabe bem o quê. Ariella tem um problema dentro e fora do filme. 

Chegamos à maquiagem dos filmes mais rasos: a psicologia (ou psicanálise). Todo o conflito interior de Ariella é fachada para logo cair nas velhas tentações das caracterizações do feminino no cinema brasileiro comercial: Ariella se masturba, se desnuda, se entrega. Sendo feita por Nicole Puzzi, resta o consolo de um jovem corpo em forma, mas é pouco para segurar o interesse. Quando não parece apenas detestável, Ariella é essencialmente unidimensional: não vive que para não saber de seu passado, coisa que não parecia lhe incomodar até o começo da projeção. E “projeção” é bem o termo: ela é uma criatura projetada, planificada, estigmatizada. Sem essa “missão” (descobrir suas origens), a personagem não existe; o filme então se revela fraco e incoerente, a vida de todos de repente muda sem razão estabelecida e todas aquelas máscaras na verdade significavam uma fuga a uma situação incontornável, espécie de metalinguagem que tem nessa “obsessão” o grande trunfo do filme — ao mesmo tempo que isso signifique seu empobrecimento, pois uma narrativa só com arquétipos e estereótipos é frouxa por natureza. 

Ariella não é um fracasso completo, contudo. Dar voz às jovens que iniciam sua carreira sexual é uma correta justiça e evidente exceção em um cinema onde as mulheres eram feras devoradoras de homens e que colecionavam amantes com a mesma rapidez e facilidade com que trocavam suas calcinhas (talvez até com maior frequência). O problema é tratá-las como seres sem alma, aguardando sempre a convocação para a vida (aí sim) relevante dos adultos.

As Sete Vampiras

Especial John Herbert

 

As Sete Vampiras
Direção: Ivan Cardoso
Brasil, 1987.
 

Por Filipe Chamy      

 

Ivan Cardoso, todos sabem, é considerado o mestre do “terrir” brasileiro, uma mistura de terror com comédia. Não sei afirmar até que ponto essa fama lhe é lisonjeira, mas também não a acho desabonadora; o que acontece é que estamos diante de um problema “quantitativo”: quem mais faz um cinema assim aqui? 

Então chegamos ao ponto de achar que Ivan Cardoso não faz um cinema paródico, mas puramente de gênero. O horror não exclui necessariamente o humor, e por isso um filme como As sete vampiras talvez seja um legítimo representante de um “terror brasileiro”, sempre nas pegadas do pioneiro Mojica Marins — a quem Cardoso homenageou anteriormente com um documentário-reflexão, aliás. 

Todo o aspecto kitsch desta obra é evidentemente deliberado, assim como toda a metalinguagem das artes “terroríficas”, as várias citações a Alfred Hitchcock, a Sherlock Holmes, a escritores policiais como Raymond Chandler: Nuno Leal Maia faz um certo “Marlou”, claro que uma brincadeira com o Marlowe chandleriano. Esse agrupamento de referências não se restringe a colar tributos e envernizar com a blindagem de “bagagem cultural” uma falta de senso cinematográfico (como é comum ocorrer); ele antes serve como uma maneira de estabelecer o terreno, criar um ambiente de fantasia com suas próprias estruturas, um mundo à parte onde a coerência e a lógica mundanas não são necessariamente presentes. Daí, talvez, o grande sofrimento de Silvia (Nicole Puzzi), a real protagonista da fita, que desde o início (quando um amigo seu tem problemas com uma planta carnívora!) pena um pouco por ser “real demais” em meio a criaturas inventadas, caracteres insólitos e toda uma organização surreal de viver, entender o mundo e agir e pensar. 

Nosso homenageado John Herbert também é um pouco uma peça de descompasso: com sua aparência “fleumática”, de porte (real class, diriam os gringos), adentrando com charme viciado o mundo da libertinagem e servindo de mote a uma clássica encenação de crime. É preciso observar que Ivan Cardoso não ridiculariza a releitura de gênero, mas se diverte imensamente ao fazê-la. 

Léo Jaime canta, Lucélia Santos exibe seus seios nus e Carlo Mossy dá uma de galã: a princípio, nada de novo no fronte; mas quando Wilson Grey encarna Fu Manchu, quando uma planta carnívora parece interessada em carne humana e quando os distúrbios verificados pelas personagens parecem não ter outra origem e explicação que não um ataque programado de seres sobrenaturais, então aí é possível vislumbrar a dimensão da farsa (no sentido teatral, não de engodo) engendrada por Cardoso e sua trupe, que podem não ter se aproximado de um materialismo inquestionável na representação do horror, mas que com certeza apresentam uma honesta abordagem em um filme digno.

A Super Fêmea

Especial John Herbert

A Super Fêmea
Direção: Aníbal Massaini Neto
Brasil, 1973.

Por Edu Jancz

“Abaixo o poder dos homens”; “Está na hora de ficar por cima”; Viva a supremacia das mulheres”; “Contra a pílula feminina”; “A favor da pílula masculina”…

Em meio a esse clima de contestação, um grupo de mulheres propõe maior participação dos homens no controle da natalidade. Em vez delas, seriam os homens que tomariam a pílula.

Uma empresa vê nessa reivindicação a possibilidade de vender milhões de pílulas e engordar a sua conta bancária. Apenas um problema: pesquisa revela que 83% dos homens temem tomar a tal pílula com medo de uma redução total ou parcial de seu desejo sexual.

Como em publicidade tudo um jeito se dá, um guru (interpretado por Perry Salles) vê a luz no fim do túnel: uma campanha que associe os três mitos brasileiros: mulher, café e jogo. O primeiro e difícil passo é achar mulher belíssima que seria nominada de Super Fêmea e defenderia incondicionalmente o uso da pílula masculina. Bem como da eficácia de tal pílula, de cor marrom, no aumento do desejo sexual dos homens.

Nasce a Super Fêmea. Surge saindo de uma piscina a deliciosa Vera Fischer, 22 aninhos, um corpo escultural, convite irrecusável para bem mais de 400 talheres. Se hoje, 2012, ainda babo falando de Vera, imaginem eu com 23 anos vendo-a de calcinha e sutiã em boa parte das cenas do filme assinado por Aníbal Massaini Neto.

Mulheres gostosas, de calcinha ou sutiã, ou com algum seio nu escapando por poucos fotogramas na tela eram uma das marcas das boas pornochanchadas. Em A Super Fêmea elas estão bem presentes e apimentam nosso paladar.

Com roteiro assinado por Lauro Cesar Muniz, A Super Fêmea pouco ou em nada nos surpreende. Seu ritmo – considerada a distância dos anos – é lento e precisamos de muita paciência para garimpar boas piadas.

Certamente, o ponto mais negativo e irritante de A Super Fêmea é o exagerado maneirismo do ator e futuro marido de Vera, Perry Salles.

Pontos a favor.  Curiosidades, citações e pequenas-grandes interpretações. Como a do ator Sérgio Hingst, que faz um “Dom Corleone” emblemático. Em sua última cena, após despachar um afilhado, o “padrinho” atira um dardo numa enorme foto de Marlon Brando que está em seu escritório. Não o Brando de O Poderoso Chefão.  O Brando de Queimada.

Outro momento pontual: o beijo lésbico, ainda que suave, entre Vera Fischer e Geórgia Gomide.

John Herbert tem participação especial. Ele é um milionário que encomenda 50 mil caixas da pílula que deixa os homens muitos mais potentes e fogosos. Por acidente, as pílulas caem num rio que municia uma estância balneária para público da Melhor Idade. Dá pra imaginar a festa e sacanagens que rolam entre pacientes – agora bem impacientes – e as jovens enfermeiras do local.

Em meio ao grande elenco, a presença de um hoje senhor respeitável e muito famoso: Silvio de Abreu. Ele dá mostras de seu talento como ator, interpretando um publicitário aparvalhado e com trejeitos muito suspeitos.

Cleo e Daniel

Especial John Herbert

 

Cleo e Daniel
Direção: Roberto Freire
Brasil, 1970.

Por Ailton Monteiro

Um dos trabalhos em que John Herbert mais se destaca, sendo seu, inclusive, o primeiro nome a aparecer nos créditos, Cleo  e Daniel é um filme dirigido pelo próprio autor do livro, o best-seller homônimo do psicanalista Roberto Freire. O livro foi lançado no país em 1966 e fez muito sucesso, especialmente entre o público jovem. A transposição para o cinema, porém, não foi assim tão bem sucedida. Há alguns bons momentos, especialmente no início, mas depois o filme parece não ter fim, mesmo não sendo de longa duração. Isso é atribuído à falta de dinheiro para finalizar a produção, que foi fechada às pressas.

Não deixa de ser curioso Freire pintando o psicanalista (Herbert) como um sujeito meio louco, irresponsável e cruel. Fica parecendo uma crítica aos próprios psicanalistas. O casal do título, vivido por Chico Aragão (Daniel) e Irene Stefânia (Cleo), também são figuras problemáticas. Daniel é viciado em comprimidos. Já Cléo também faz um papel de maluquinha, primeiro se apresentando no consultório do psiquiatra em crise que nem está muito a fim de clinicar. Ela acabara de sofrer um aborto, ajudada pela mãe, vivida por Beatriz Segall.

Em alguns momentos, o filme passa a impressão de tentar emular Khouri, até pela trilha sonora de Rogério Duprat. Mas as tentativas de parecer existencialista são frustradas pela pouca experiência na direção de Freire. Não à toa, Cleo e Daniel foi a única vez que o psicanalista e escritor se aventurou a dirigir um filme.

Alguns momentos são bonitos plasticamente, como a câmera acompanhando a luminária balançando como um pêndulo na cena de sexo entre um casal de jovens. Alguns travellings também são bonitos, bem como a fotografia em preto e branco. O que também ajuda a compor a beleza do filme é a figura de Irene Stefânia, vinda de Fome de Amor, de Nelson Pereira dos Santos. Lembrando que no filme de Nelson, Irene quase eclipsa Leila Diniz, mesmo com a apatia de sua personagem.  Uma atriz que aparece em Cleo e Daniel e que eu não reconheci é Sônia Braga, anos antes de se tornar um dos maiores símbolos sexuais que o país já conheceu.

Os Bons Tempos Voltaram: Vamos Gozar Outra Vez – episódio Primeiro de Abril

Especial John Herbert

Os Bons Tempos Voltaram: Vamos Gozar Outra Vez  – episódio Primeiro de Abril
Direção: John Herbert
Brasil, 1984.

Por Matheus Trunk

Cinema, teatro, televisão. O ator e diretor John Herbert (1929-2011) foi um profissional multimídia. Dentro da sétima arte, sua presença foi constante em todos os gêneros. Participou de chanchadas no Rio de Janeiro e de produções do cinema industrial paulista. Chegou a estar presente em filmes que flertavam com o Cinema Novo (Bebel, Garota Propaganda de Maurice Capovilla), Cinema Marginal (Capitão Bandeira Contra o Doutor Moura Brasil de Antônio Calmon), ciclo do cangaço e diversas pornochanchadas. Trabalhou ao mesmo tempo com estrelas populares como Mazzaropi e realizadores autorais como Walter Hugo Khouri.

Herbert tentou a direção em poucas oportunidades. Em 1984, aceitou o convite do amigo Aníbal Massaini Neto para realizar um episódio. As salas nacionais já estavam entupidas pelas películas de sexo explícito. Mesmo assim, a produtora Cinedistri resolveu bancar uma comédia erótica em dois episódios. O primeiro coube ao realizador carioca Ivan Cardoso. Já o segundo, Primeiro de Abril, ficou sob a direção de John Herbert.

A trama do episódio gira em torno do golpe militar ocorrido em 31 de março de 1964. Justamente nesse dia é o aniversário do playboy Edinho (Marcos Frota). O jovem arma a maior festa em sua mansão. O rapaz não resiste à beleza de sua prima revolucionária (Kátia Lopes) e da bela namorada (Vanessa Alves). Embora o argumento pareça sério, Herbert aborda os acontecimentos históricos de maneira jocosa. O episódio parece tirado das comédias de Mário Monicelli. O destaque fica por conta do gigante Dionísio Azevedo, que faz o avô de Edinho, Aldemiro, um senhor reacionário que demonstra seu apoio irrestrito ao golpe. Não admite a pouca vergonha da mocidade.

Esta seria a última investida de Herbert na direção cinematográfica. Seu talento estaria presente em mais alguns longas-metragens (somente como ator), peças teatrais e novelas. Com típico físico de galã conservado graças à natação, John Herbert foi um dos maiores nomes da TV brasileira. Autêntico bon vivant, casou inúmeras vezes e era palmeirense convicto. Sua morte encerrou uma trajetória brilhante de um homem dedicado às artes brasileiras.

A Grande Vedete

Especial John Herbert

 

A Grande Vedete
Direção: Watson Macedo
Brasil, 1958.
 

Por Sérgio Andrade
 

Janete (Dercy Gonçalves) é a veterana estrela de uma companhia teatral que se recusa a admitir que já passou da idade para representar certos papéis. Os aplausos e pedidos de autógrafo e flores que recebe em seu camarim são de responsabilidade de seu fiel secretário Ambrósio (Catalano), que tem pena que ela descubra que não é mais admirada como antes.

Dirigido pelo mestre das chanchadas Watson Macedo, tendo Oswaldo Massaini, da Cinedistri, como produtor associado, o filme tem ecos de Crepúsculo dos Deuses, ao mostrar como é difícil para certas pessoas do meio artístico, depois de alcançarem grande sucesso na carreira, reconhecerem que está na hora de passar o bastão para os mais jovens.

Apesar dos nomes envolvidos, que poderia sugerir uma chanchada tradicional (tem também a impagável Zezé Macedo como a eterna noiva de Ambrósio), trata-se de uma “dramédia”, drama com toques cômicos proporcionados pelo talento histriônico de Dercy, que também demonstra insuspeitas qualidades dramáticas.

John Herbert, já um veterano com 10 filmes no currículo, interpreta Paulo, autor teatral apaixonado pela bailarina Wilma (a argentina Marina Marcel, emprestada por Carlos Machado, o rei da noite carioca), para quem está escrevendo uma peça. Mas Janete lê a peça pensando ter sido escrito para ela, apaixonando-se por Paulo. Não é um papel fácil, pois Paulo fica dividido entre o amor por Wilma e o carinho que passa a sentir por Janete, resistindo em revelar a verdade para não machucá-la. O grande ator, com sua fina estampa, dá conta do recado.

Mas claro que o filme foi realizado para o brilho de Dercy, que canta algumas músicas (Saias Curtas, Tome Polca). Dá vontade de aplaudir de pé!

Maria 38

Especial John Herbert

Maria 38
Direção: Watson Macedo
Brasil, 1959.

Por Adilson Marcelino

 

Nome de ouro das chanchadas da Atlântida, Watson Macedo é sinônimo também de alta estirpe na história do cinema brasileiro. Seja nas comédias que dirigiu para o estúdio carioca ou em suas produções independentes, seu nome na ficha técnica sempre foi garantia de grande cinema.

Em Maria 38 ele coloca no centro da cena mais uma vez sua estrela predileta, Eliana Macedo – sua sobrinha revelada nas telas por ele e que se tornaria uma das maiores atrizes do cinema nacional.

Só que aqui sua personagem é bem diferente das mocinhas da Atlântida, pois sua Maria 38 é uma vigarista que apronta todas na Lapa e leva a alcunha porque reza a lenda de que anda com um trezoitão escondido no vestido.

A presença de Maria 38 é sempre sinal de confusão. Só que ela tem ao seu lado seu amigo de infância, o eternamente apaixonado John Herbert, agora o guarda do pedaço.

Tudo o que ele mais quer é que Maria se endireita para que eles possam se casar, já que ainda acredita no bom coração da moça. E quando ela aceita um emprego como babá, ele pensa que finalmente ela mudou, mas mal sabe ele que os planos da moça são outros.

Maria 38 troca as boates da Atlântida por uma agitada gafieira, com direito a número inesquecível de Moreira da Silva interpretando Na Subida do Morro com sua verve inconfundível. E no elenco conta com os talentos de Zilka Salaberry, Afonso Stuart e Augusto César Vanucci.

Destacam-se a belíssima fotografia de Amleto Daissé e a química perfeita entre Eliana e John Herbert, casal que já dera liga em outro ótimo filme de Macedo, Alegria de Viver (1958).

Cada um dá o que tem – Episódio Cartão de Crédito

Especial John Herbert

 

Cada um dá o que tem – episódio Cartão de Crédito
Direção: John Herbert
Brasil, 1975.

Por Adilson Marcelino

 

Prática comum nos anos 1960 e 70, o filme em episódios rendeu vários títulos na filmografia brasileira. As Cariocas, Trilogia do Terror, Ninguém Seguras Essas Mulheres, Já Não se Faz Amor como Antigamente, Contos Eróticos e Os Bons Tempos Voltaram: Vamos Gozar Outra Vez são alguns exemplos.

O filme em episódios, geralmente, tem cada seguimento dirigido por um cineasta diferente. Daí, quase sempre, o resultado difere em muito de um episódio para o outro.

Neste Cada um dá o que tem não foi diferente. O filme reúne os talentos de Adriano Stuart, John Herbert e Silvio de Abreu atrás das câmeras, mas é o último que se sai melhor em seu intento.

Cartão de Crédito, dirigido por John Herbert, é o episódio do meio. Nele, além de dirigir, Herbert também dá vida ao protagonista Otávio. Depois de passar seis meses no meio do mato em plena Amazônia, ele desembarca em São Paulo com intenção de se esbaldar na noite. Seu plano? traçar uma gostosa que resolva sua seca de meses – “lá não tinha índia?”, questiona a prostituta; no que ele responde prontamente: “mas a índia tinha índio”.

Só que consumar o fato vai ser mais difícil do que Otávio possa imaginar, pois primeiro cruza com uma travesti e depois com uma prostituta mercenária pronta para enfiar a faca em seu cartão de crédito.

Primeira incursão de John Herbert como cineasta, em Cada um dá o que tem o principal destaque foi reunir na tela o Casal Doçura dos anos 50/60, John Herbert e Eva Wilma, época em protagonizavam pioneira sitcom de sucesso na telinha, Alô Doçura.

Casados na vida real, o filme se situa exatamente em época de transição do famoso par, pois pouco depois Eva Wilma se separaria de Herbert para viver com Carlos Zara, seu amor até o fim da vida.

Vale ressaltar que a nudez de Eva no filme, algo inesperado em sua filmografia, é fake, já que foi dublada – a tal prática do dublê de corpo que originaria o filmaço de Brian de Palma. 

Cartão de Crédito é episódio irregular de um cineasta ainda em formação.

 

Já não se faz amor como antigamente – episódio O Noivo

Especial John Herbert

Já não se faz amor como antigamente – episódio O Noivo
Direção: John Herbert
Brasil, 1976.

Por Adilson Marcelino

Antes de chegar aos longas, o delicioso Ariella e o comentado, mas um tanto inacessível, Tessa, a Gata, John Herbert se aventurou nos filmes em episódios.  Ele dirigiu dois seguimentos: Cartão de Crédito, em Cada um dá o que tem; e esse O Noivo, em Já não se faz amor como antigamente.

Aliás, foi mais que uma aventura, já que voltou a dirigir mais um episódio na sua despedida das telas como cineasta em Os Bons tempos voltaram: vamos gozar outra vez!, dirigindo o seguimento Primeiro de Abril.

Um primeiro olhar na ficha técnica de O Noivo causa estranheza: Lygia Fagundes Telles foi parar na Boca do Lixo? Pois é, é porque o episódio é baseado no conto homônimo escrito pela refinada e elegante escritora, dona de um universo personalíssimo e marcado por tramas em que o onírico e o fantástico habitam o cotidiano urbano de forma natural, mas sempre intrincada.

Porém, para quem conhece a pena de Lygia, e mesmo o conto adaptado por Cassiano Gabus Mendes, verá que o que sobreviveu no filme foi mais o argumento do que a ambiência arquitetada pela escritora. Não que essa ambiência não esteja presente no desespero de Macedinho (John Herbert), um homem que acorda no que para ele seria uma manhã qualquer, mas descobre que, na verdade, aquele é o dia de seu casamento. Aflito, ele se lembra de tudo e de todos, portanto não sofreu amnésia, mas não consegue se lembrar do casamento e, pior ainda, com quem irá se casar.

Só que o roteiro de Cassiano e a direção de John tomam caminhos outros, dando corpo em cena às possíveis noivas de Macedo, insistindo sempre na busca de uma graça que inexiste no conto de Lygia – afinal, Já não se faz amor como antigamente é uma comédia. Herbert conta, inclusive, que procurou a autora e ela lhe deu carta branca para adaptar do jeito que quisesse.

É caminho inútil e um tanto obtuso ficar analisando cinema versus literatura, pois são linguagens diferentes, mas essas linhas gastas aqui são creditadas mesmo devido aquele susto inicial narrado antes.

Pelo filme em si, pode se notar um avanço no caminhar do ofício da direção de John Herbert, que ainda que se utilize de recursos gratuitos e clichês – como o grito do Tarzan, o carro sacolejando e de farol aceso – mantém o fluxo da narrativa.

Como é uma produção da Boca do Lixo – Aníbal Massaini Neto e o próprio diretor -, as famosas deusas não poderiam faltar. E aqui há lugar para a eterna ninfeta Nádia Lippi, a sapeca Djenane Machado, e a exuberante Vera Gimenez – que protagoniza a melhor cena. Há espaço ainda para Laura Cardoso e uma presença inesperada.

O Noivo valeu a John Herbert o APCA de Melhor Diretor.