As Sete Vampiras

Especial John Herbert

 

As Sete Vampiras
Direção: Ivan Cardoso
Brasil, 1987.
 

Por Filipe Chamy      

 

Ivan Cardoso, todos sabem, é considerado o mestre do “terrir” brasileiro, uma mistura de terror com comédia. Não sei afirmar até que ponto essa fama lhe é lisonjeira, mas também não a acho desabonadora; o que acontece é que estamos diante de um problema “quantitativo”: quem mais faz um cinema assim aqui? 

Então chegamos ao ponto de achar que Ivan Cardoso não faz um cinema paródico, mas puramente de gênero. O horror não exclui necessariamente o humor, e por isso um filme como As sete vampiras talvez seja um legítimo representante de um “terror brasileiro”, sempre nas pegadas do pioneiro Mojica Marins — a quem Cardoso homenageou anteriormente com um documentário-reflexão, aliás. 

Todo o aspecto kitsch desta obra é evidentemente deliberado, assim como toda a metalinguagem das artes “terroríficas”, as várias citações a Alfred Hitchcock, a Sherlock Holmes, a escritores policiais como Raymond Chandler: Nuno Leal Maia faz um certo “Marlou”, claro que uma brincadeira com o Marlowe chandleriano. Esse agrupamento de referências não se restringe a colar tributos e envernizar com a blindagem de “bagagem cultural” uma falta de senso cinematográfico (como é comum ocorrer); ele antes serve como uma maneira de estabelecer o terreno, criar um ambiente de fantasia com suas próprias estruturas, um mundo à parte onde a coerência e a lógica mundanas não são necessariamente presentes. Daí, talvez, o grande sofrimento de Silvia (Nicole Puzzi), a real protagonista da fita, que desde o início (quando um amigo seu tem problemas com uma planta carnívora!) pena um pouco por ser “real demais” em meio a criaturas inventadas, caracteres insólitos e toda uma organização surreal de viver, entender o mundo e agir e pensar. 

Nosso homenageado John Herbert também é um pouco uma peça de descompasso: com sua aparência “fleumática”, de porte (real class, diriam os gringos), adentrando com charme viciado o mundo da libertinagem e servindo de mote a uma clássica encenação de crime. É preciso observar que Ivan Cardoso não ridiculariza a releitura de gênero, mas se diverte imensamente ao fazê-la. 

Léo Jaime canta, Lucélia Santos exibe seus seios nus e Carlo Mossy dá uma de galã: a princípio, nada de novo no fronte; mas quando Wilson Grey encarna Fu Manchu, quando uma planta carnívora parece interessada em carne humana e quando os distúrbios verificados pelas personagens parecem não ter outra origem e explicação que não um ataque programado de seres sobrenaturais, então aí é possível vislumbrar a dimensão da farsa (no sentido teatral, não de engodo) engendrada por Cardoso e sua trupe, que podem não ter se aproximado de um materialismo inquestionável na representação do horror, mas que com certeza apresentam uma honesta abordagem em um filme digno.