Depoimento: Zilda Mayo

Dossiê Alfredo Sternheim

O que eu tenho pra falar dele é que ele sempre foi uma pessoa linda, a nossa amizade, a nossa convivência de trabalho, a gente trabalhou bastante junto, fizemos muitos filmes juntos. Ele sempre foi uma ótima pessoa, ele é até hoje meu grande amigo. Uma pessoa que estava sempre no set de filmagem, sempre alegre, sempre rindo, sempre tratando muito bem as pessoas, nunca tivemos nenhum tipo de problema. Então eu acho que ele é uma pessoa extraordinária, o que eu tenho a falar sobre ele é só coisa boa, porque ele é um amigo que está no meu coração até hoje, a gente sempre se fala. Nas vezes que trabalhamos juntos foi ótimo, nunca tivemos nenhum tipo de problema, nunca, sempre uma pessoa querida, uma pessoa respeitada, e um ótimo profissional. Até hoje ele é muito querido por todos os amigos, pelas profissionais do cinema, ele sempre foi muito, muito mesmo querido de todo mundo.

Eu só tenho que falar de todo o meu carinho por ele, minha amizade, uma pessoa linda que eu sempre admirei, admiro até hoje. E meu respeito por ele, porque ele sempre teve assim, apesar da época, do preconceito, ,foi sempre uma pessoa muito respeitador, como todos os outros que trabalharam comigo, né? Então esse respeito ele sempre teve com as atrizes, com os profissionais que faziam os filmes, sempre uma pessoa muito respeitador. Então eu só tenho que falar muito bem dele, e agradecer por ele ser meu amigo. Fico muito feliz em poder falar sobre ele, uma pessoa maravilhosa.

Zilda Mayo é atriz e uma das amigas de Alfredo Sternheim. Trabalhou com o cineasta em Tensão e Desejo (1983).

Depoimento: Sérgio Andrade

Dossiê Alfredo Sternheim

Conheci o Alfredinho pessoalmente na época que promovi a mostra Cinco Visões de Nosso Cinema, na Biblioteca Prestes Maia, em março de 2007.

Nosso primeiro encontro se deu numa sexta-feira, dia 09, quando eu, ele, o Antonio Carlos, a Andrea Ormond, o Matheus Trunk e o Marcelo Carrard fomos jantar num aconchegante restaurante da Rua Augusta. Até hoje me lembro da generosa porção de bife a parmegiana que nos foi servida, além de muita cerveja e ótimas conversas até altas horas.

O segundo encontro ocorreu no dia 31, na Biblioteca, quando foi exibido Anjo Loiro seguido de um debate com o diretor.

Lembro que ele ficou curioso em saber do Vinícius Del Fiol, dono da fita em 16mm, como ele conseguiu a cópia, já que era dificílima de encontrar. Alfredinho nos falou dos problemas que teve com a censura do regime militar que exigiu muitos cortes, em especial nas cenas de nudez.

Fazia muito tempo que ele não revia o filme. Sentei-me ao seu lado durante a projeção, e ele comentava comigo sobre os locais onde foram realizadas as filmagens, como foi feita tal cena, reclamava dos cortes visíveis. Mas minha maior emoção foi ouvi-lo cantarolar, baixinho, a brilhante música de Mário Edson. Fico muito feliz em ter podido proporcionar esse reencontro entre a obra e seu criador. Como bem disse a Andrea, momentos como esse a gente guarda numa prateleira bem acessível da memória, pra nunca mais esquecer.

Após a exibição, ele debateu a obra com o público, mediado pelo Matheus. Foram quase duas horas que encantou a todos os presentes pela sua inteligência, ótima memória, simpatia e muito bom humor.

Tive a felicidade de reencontrá-lo recentemente na entrega do Prêmio IBAC, do qual ele foi um dos jurados da categoria Melhor Contribuição para Cinema e a Zingu! saiu vencedora.

No coquetel oferecido depois da premiação, tivemos mais uma oportunidade de excelente bate-papo com esse grande ser humano que é Alfredinho Sternheim.

Sérgio Andrade é bibliotecário, amante do cinema brasileiro e redator da Zingu!. Em 2007, promoveu a Mostra Cinco Visões de Nosso Cinema, em que foi exibido Anjo Loiro, de Alfredo Sternheim.

Depoimento: Rubens Ewald Filho

Dossiê Alfredo Sternheim

Perguntam com freqüência qual o critico que me influenciou e sinceramente tenho dificuldade em responder. Foram muitos e nenhum. Nem mesmo Rubem Biáfora que só fui conhecer melhor quando nos tornamos colegas de jornal. Mas tinha um critico que eu lia, guardava o nome e de que gostava muito: Alfredo Sterheim, que escrevia no Estado de S. Paulo. Até hoje ainda admiro seu estilo limpo, claro, com belo texto mas sem pedantismo. Onde dá para perceber que é bem informado (e bem formado). Que sabe das coisas mas não se preocupa em gritar isso aos quatro ventos. E demonstra a cada momento sua paixão pelo cinema e seu inconformismo com a má utilização da linguagem, a estreiteza de ideias e a mesquinhez do ambiente.

Nunca disse isso para ele, nem mesmo quando nos tornamos amigo. Ou talvez por causa disso mesmo. A gente acha que não precisa. Mas havia outra razão para minha admiração. É que Alfredinho, assim carinhosamente chamado, tinha o mesmo sonho que eu, que era o de fazer cinema. Já havia sido assistente de Walter Hugo Khoury, um diretor que eu admirava. Ou seja, era um “role model”, alguém para quem eu olhava como modelo a seguir. Daí meu entusiasmo acompanhando sua carreira como diretor, torcendo pelos seus filmes. E às vezes mesmo,confesso me aborrecendo se por acaso eles não chegavam a ter o resultado desejado.

Mesmo porque a vida de diretor de cinema em qualquer lugar do mundo não é fácil. Mas no Brasil é ainda mais difícil (pensando bem como tudo neste país onde a regra é se matar um leão por dia). Vendo os problemas que Alfredino enfrentava, acho que de certa maneira me fez decidir em ser apenas critico. Não achei que tivesse talento para dar tal passo.
Esse talento para escrever temos confirmado aqui mesmo na Coleção Aplauso, onde Alfredo escreveu varias biografias ( Luiz Carlos Lacerda, Arlete Montenegro, David Cardoso, Suely Franco) e fez um antológico e inédito Dicionário da Boca do Lixo – Cinema da Boca – Dicionário de Diretores. E que culmina agora nesta sua autobiografia sincera e reveladora. Mas quando alguém conta sua própria historia há algumas omissões. O que Alfredinho não podia revelar é o belo ser humano que ele é, amigo de seus amigos, de um enorme generosidade e grandeza de alma. Por nos todos, amado e respeitado.

Rubens Ewald Filho é crítico de cinema, autor de vários guias de cinema, comentarista do Oscar, novelista, diretor de teatro.

Obs.: convidado a dar depoimento sobre Alfredo Sternheim, Rubens Ewald Filho destacou este texto que escreveu para a biografia de Alfredo, Um Insólito Destino, publicada pela Coleção Aplauso.

Depoimento: Reynaldo Paes de Barros

Dossiê Alfredo Sternheim

O Alfredo é uma excelente pessoa, um verdadeiro gentleman. Eu só posso falar bem dele como ser humano e também como diretor. Ele sempre foi um profissional bastante competente, muito preocupado com seus trabalhos. Atualmente, estou morando em Campo Grande, no Mato Grosso do Sul, mas mesmo assim continuamos nos falando por telefone. Sempre foi um prazer enorme trabalhar com uma pessoa como ele. Nosso primeiro trabalho juntos foi no Anjo Loiro e depois fizemos outros que eu assinei com pseudônimo. Eu sei que eu estava ganhando a vida honestamente trabalhando para terceiros. Sobre o Alfredo posso dizer que ele não é aquele grosso que veio das cavernas e terminou no cinema. Não, ele é uma pessoa com uma grande formação e estava muito acima da média do pessoal da Boca do Lixo da época. Sobre o Alfredo eu só tenho elogios.

Reynaldo Paes de Barros, cineasta e diretor de fotografia. Trabalhou com Alfredo Sternheim como diretor de fotografia em Anjo Loiro (1973) e Sacanagem (episódio Gatas no Cio) (1983).

Depoimento: Neide Ribeiro

Dossiê Alfredo Sternheim

O que eu vou falar do meu amigo. É uma pessoa muito íntegra, é uma pessoa com um talento maravilhoso, desperdiçado, porque ele não está fazendo nada em termos de cinema, que é o que ele gosta, né? É uma pessoa culta, é uma pessoa amiga, é uma pessoa que você pode contar para todas as horas, as boas e as más, que ele vai estar ali do seu lado.

É uma pena que todo esse talento dele está esquecido, né? Não sei se o campo está cheio de gente nova, e as pessoas talvez não dê credibilidade a uma pessoa que tenha mais conhecimento, mais prática, mais tudo na vida, mais experiência. Ele tem um talento extraordinário para dirigir, um diretor fantástico, mas tá faltando oportunidade para ele mostrar isso mais um pouco.

É meu amigo do coração, gosto muito dele.

Neide Ribeiro é atriz e uma das amigas de Alfredo Sternheim. Trabalhou com o cineasta em Corpo Devasso (1980), Violência na Carne (1980), e no episódio Gatas no Cio do longa Sacanagem (1981).

Depoimento: Elisabeth Hartmann

Dossiê Alfredo Sternheim

Bom, o Alfredo Sternheim eu conheço também desde sempre. Eu cheguei em São Paulo em 1961, e, naquele mesmo ano, eu fui fazer um filme escrito e dirigido pelo Walter Hugo Khouri (A Ilha), e o Alfredo Sternheim, que era um menininho naquela época, fez a assistência de direção. E foi lá que a gente se conheceu, e nos conhecemos até hoje, continuamos nos descobrimos até hoje rsrs. Porque o ser humano é muito mutável, né?. Então foi assim, a gente filmava lá na Bertioga, e o Alfredinho sempre correndo pra lá e pra cá, porque o Khouri também, às vezes, ficava nervoso, e gritava daqui e gritava dali. E um dia chovia, outro dia fazia sol, e tudo isso vai criando, às vezes, um clima assim, eu diria, quase no limite da histeria. E ele, na sua juventude, eu acho que era o primeiro filme dele também, ele era muito atento e muito preocupado também. E a gente logo começou a ter simpatia um pelo outro, e fomos nos relacionando pela vida a fora.

Ali ele foi assistente, mas depois disso ele também se tornou um diretor, e um diretor muito competente, muito reconhecido, que fez belos filmes, foi premiado tantas vezes, né? E eu fiz alguns filmes com ele. Fiz uma coprodução Brasil/Argentina, acho que se chamava A Herança dos Devassos. Depois, o último filme que a gente fez, eu não estou seguindo uma ordem cronológica,era tão interessante, era um episódio que se chamava Gatas no Cio. Infelizmente, quando esse filme foi para as telas eu nem vi, ele foi com o nome de Sacanagem, nunca vi uma coisa assim, e não tinha nada de sacanagem. A direção era dele, o roteiro era dele, era uma história de uma mulher muita velha com quase cem anos de idade, uma ex-dona de um prostíbulo. E aí a história é toda contada em flash back. Então, quando ela era jovem, as moças que trabalhavam na casa dela eram as tais gatas. E quando as moças se sentiam agredidas, elas se transformavam em gatas mesmo. É uma história muito interessante. Principalmente a história do meu personagem, eu tinha quase cem anos de idade e depois voltava à mocidade. Então tinha também um trabalho muito bonito do maquiador. Esse filme eu nunca cheguei a ver no cinema. Eu nem soube que ele foi levado com esse título, e, inclusive, havia dois outros filmes juntos, que parecem que não eram muito recomendados. Eu fiz também um filme com a Kate Hansen e o Eduardo Tornaghi, A Mulher Desejada, em que eu fazia a mãe do Tornaghi, uma mãe possessiva. Curioso o filme também, muito interessante a história.

Agora, o Alfredo, como é que é o Alfredo? Talentoso, injustiçado… Porque quando o cinema entrou naquela área da pornochanchada, acho até que ele dirigiu alguma coisa. Não era nem a pornochanchada, era filme de sexo explícito. Depois o cinema entrou na defasagem total, porque houve aquele movimento todo anti-cultural, e o cinema sumiu. E nesse período em que o cinema sumiu, o Alfredo começou a se dedicar à critica e a escrever artigos, e quando o cinema voltou, e voltou muito bem, graças a Deus, eu acho que já não havia espaço para muitas pessoas. Inclusive comigo. Quando alguém me pergunta “por que você não faz cinema?”, eu respondo “ pois é, mas não estou na Globo”. Eu não falo isso no sentido pejorativo não, mas é porque hoje é tudo dominado por atores e diretores da Globo, então o espaço ficou bastante reduzido. E foi o que aconteceu com o Alfredo, o que é uma pena, porque é uma pessoa muito talentosa e muito criativa, os roteiros dele eram muito interessantes.

Eu sempre brinco com o Alfredo, porque assim como eu, que sou descendente de alemão, ele também tinha um pai alemão, daí o nome dele, Sternheim. E em alemão, Stern é estrela e heim é lar, então eu acho que ele deu guarida e transformou muitas pessoas em estrelas, pelo seu próprio nome. Eu acho que ele também é uma estrela que brilhou no cinema nacional e deveria estar aí fazendo cinema. Mas as coisas vão mudando, e, de repente, as pessoas são meio esquecidas, meio afastadas. Eu não sei bem por que, são as circunstâncias, porque tudo vai mudando. E é uma pena, porque talento não lhe falta, criatividade não lhe falta. É uma pessoa extremamente generosa, o trabalho com ele sempre foi prazeroso, porque pelo menos comigo ele nunca se exaltou, sempre me conduziu muito bem, com muita segurança, sempre me senti muito bem fazendo cinema com ele, e eu acho que a maioria das pessoas deve ter se sentido assim.

Nos filmes do quais eu participei nunca houve uma situação difícil. A coprodução argentina, que era com a Sandra Bréa e o Roberto Maya, foi um pouco mais complicada, porque o tal diretor argentino, não sei como esse homem era diretor. Tanto é que o Alfredo acabou dirigindo esse filme. Porque o homem lá não entendia nada, eu acho. Mas, mesmo assim, não se criou uma situação desagradável não, tudo correu na mais perfeita ordem, o filme era bem interessante.

Bom, é isso o que eu posso falar a respeito do Alfredo. O Alfredo é um dos meus queridos, é uma pessoa que sempre vai estar no meu coração. Porque a nossa amizade aconteceu através do trabalho, mas se manteve, se mantém, fora dessa área, pois nunca mais trabalhos juntos. Eu acho que a gente não fez mais nada juntos depois desses filmes, pelo menos eu não me lembro. E eu acho que ele merecia um lugar ainda no cinema, sabe? Mas como eu já falei, as circunstâncias não são tão favoráveis quanto as pessoas mereceriam.

Mas quem sabe de repente também, enquanto a gente está falando aqui, de repente pode aparecer uma nova oportunidade. Por que não? Ele é tão inteligente, ele é tão atento também à vida, aos acontecimentos, é uma pessoa que está sempre em dia com tudo que está acontecendo. Ele não se deixa abater, ele continua aí lutando, pela sua sobrevivência, pelo que ele acha que é verdadeiro, pelo que ele acredita. Então quem sabe amanhã ou depois ele pode ter uma nova chance. Por que não, né?

É isso que eu tenho para falar do meu amigo Alfredo.

Elisabeth Hartmann é atriz e uma das amigas de Alfredo Sternheim. Trabalhou com o cineasta em A Herança dos Devassos (1979 – co-direção de César Cabral) e no episódio Gatas no Cio, do longa Sacanagem (1981).

Depoimento: Edu Jancz

Dossiê Alfredo Sternheim

Eu conheço o Alfredinho desde 1973, quando fui aluno dele na FAAP. Desde esse tempo, eu sempre percebi que o Alfredo é uma pessoa muito justa, honesta e leal. Ele é um tipo de homem que briga pelos ideais de respeito, igualdade e justiça. Isso está impregnado nos filmes dele como no Sexo dos Anormais. Ele retrata na película pessoas que estão à margem da sociedade, como homossexuais, bissexuais e transexuais. Tudo isso sem deboche, sem descaso e retratando essas pessoas como parte do nosso cotidiano. Você veja o caso desse programa Big Brother, em que um transexual participou e deixou as pessoas tremidas. Estamos em 2011. Pois bem, o Alfredo já tratava desse tema em seus filmes em 1985. Como crítico de cinema, o Alfredo foi um defensor intransigente dos direitos humanos e do cinema paulista.

Ele teve brigas homéricas com o pessoal da Embrafilme, que fazia desapropriação de dinheiro público. Ele entrevistou gente conhecida internacionalmente como Fritz Lang e Marlene Dietrich. O Alfredo é um exemplo de caráter e é um dos meus maiores amigos. Ao longo dos anos, muitas pessoas mudam. Mas ele permaneceu com uma retidão notável.

Se ele tivesse prosseguido com os trabalhos na televisão, ele poderia hoje estar na Globo, por exemplo. Mas ele nunca quis abandonar o cinema. Essa é a grande paixão da vida dele. Ele também é um profundo conhecedor de ópera, música clássica e cinema japonês. Quando eu fui editar a Cinevídeo, chamei o Alfredo para colaborar por causa da cultura e do conhecimento dele. Durante os dois anos que a revista existiu, ele foi um colaborador muito ativo.

Edu Jancz (José Edward Janczukowicz), jornalista e crítico de cinema. Trabalhou com Alfredo Sternheim na revista Cinevídeo.

Depoimento: David Cardoso

Dossiê Alfredo Sternheim

O Alfredo é um camarada da minha época do cinema, temos quase a mesma idade e somos contemporâneos. Nós nos conhecemos durante a realização do Noite Vazia, do Walter Hugo Khouri, que foi um grande sucesso de bilheteria. Eu fazia um papel de ator e o Alfredinho era um dos assistentes. Nos anos 60, ele já era um dos críticos mais conceituados, era uma espécie de Rubens Ewald Filho da época. Apesar de todo esse conhecimento, ele não é apenas um teórico de cinema. Ele também põe a mão na massa.

Uma coisa legal do Alfredo é que ele alia teoria e prática. Isso é muito difícil na área cinematográfica, porque muitas pessoas sabem escrever uma crítica, mas não sabem fazer uma enquadração. O meu colega Paulo Autran, por exemplo, fez um filme e nem ele mesmo foi ver. Por quê? Porque ser ator de teatro, de cinema e dirigir é muito diferente. Mas o Alfredo teve uma verdadeira escola de cinema que foi o Walter Hugo Khouri. Ele tornou-se diretor com um grande embasamento.

Quando chamei o Alfredo pra fazer o Corpo Devasso, ele já tinha feito aquele filme com a Vera Fischer (Anjo Loiro) e estava estourando. Como meu diretor, o Alfredo não criou nenhum problema. Trabalhar com ele é como trabalhar com o Ozualdo Candeias e com o Jean Garrett. Corpo Devasso é um filme muito bem feito, com começo, meio e fim. É uma espécie de Midnight Cowboy sabe? Eu acho que ele acertou em cheio na época fazendo esse filme. Ele cumpriu todos os prazos estipulados e não deu uma de estrela em nenhum momento. Tem muito diretor que faz isso. Me lembro que a gente começou a fazer o filme num dia 10 de um mês e terminou no dia 15 do seguinte. Ele não perdia tempo durante uma filmagem. Por exemplo: se estivesse chovendo, a gente passava a filmar uma cena interior. Ele sabia aproveitar todas as oportunidades.

A última fez que eu estive com o Alfredo foi em São Paulo há uns dois anos. Nos encontramos num shopping e eu percebi que ele estava meio amargurado com a situação do cinema. Isso muitas vezes também acontece comigo também. Desde que o cinema brasileiro ficou restrito a ter ajuda estatal ficou difícil filmar.

Infelizmente, a produção hoje ficou na mão dos ladrões do cinema brasileiro. Atualmente, um filme se paga na pré-produção. O camarada faz uma fita com parte da verba do governo e o resto ele põe no bolso. Acabou o respeito e mesmo o glamour com o cinema. Não é como eu, Mazzaropi, Zé do Caixão. A gente tinha que correr no Marabá pra ver se o filme tinha bilheteria. Você pega o meu estado, por exemplo, hoje em dia somente duas cidades têm cinema. Antes, tinham salas de cinema em 14 cidades. Municípios como Maracaju, Dourados e mesmo Corumbá não tem nenhum cinema. Poxa, Corumbá não é cidade pequena, tem 150 000 habitantes e nenhum cinema. Só tem igrejas. O camarada fica rasgando dinheiro do povo e ainda acham bonito.

Eu acho que se o Alfredinho tivesse virado produtor, ele poderia ter feito mais grandes trabalhos. Ele fez muita coisa boa. Muitas vezes eu fico vendo meus filmes no Canal Brasil, relembrando o passado e fico chateado. Depois, a gente ainda vê amigos falecendo como o Anselmo Duarte e agora o John Herbert. É triste. Mas eu não paro, realizei um curta chamado Maria Fumaça, Chuva e Cinema e todos que viram gostaram. Também participei como ator do Cabeça a Prêmio, do Marco Ricca.

David Cardoso, ator, produtor e cineasta. Trabalhou com Alfredo Sternheim como produtor e ator de Corpo Devasso (1980).

Depoimento: Celso Sabadin

Dossiê Alfredo Sternheim

Eu conheci o Alfredo quando a gente trabalhava juntos numa revista chamada Classinews Vídeo. Era uma revista destinada ao fã de vídeo, e tudo mais. Eu já era o editor quando ele entrou para ser o subeditor.

Sinceramente, eu não o conhecia.. E foi um período extremamente rico para mim, muito rico, porque o Alfredo veio, na época eu tinha acho que uns trinta anos, mais ou menos, e ele veio com a experiência dele, com a visão que ele tem de cinema, com as histórias deliciosas que ele contava na redação e todo mundo parava para dar risada, histórias de bastidores das filmagens. E eu fui, aos poucos, ficando fã dele.

Depois a revista parou e a gente continuou mantendo uma certa amizade porque o Alfredo, ele é de uma honestidade a toda prova, ele é um sujeito de uma integridade que poucas vezes você vê. Pra ele o que é justo é justo, não tem maracutaia, não quer saber de coisas por fora, de coisas mal explicadas, é extremamente transparente. Daí, inclusive, a eterna indignação que ele tem contra as leis de incentivo à cultura do cinema brasileiro, contra essa política das pessoas pegarem dinheiro público e fazerem filmes que ninguém vai ver, ou quase ninguém vai ver.

Ele é um eterno indignado. E é uma indignação embasada, não é gratuita. Então essa indignação dele faz com que, por um lado, ele sofra muito internamente. Ele tá sempre indignado com isso, escrevendo em blogs, mandando mensagens pra sites, falando aos quatro ventos para quem quiser ouvir, porque ele realmente não compactua com isso. E por outro lado, faz com que ele solte também, não fique preso na garganta, essas coisas não devem fazer mal ao fígado dele, porque ele realmente bota pra fora.

Então eu tenho uma admiração incrível por ele. Não é porque vocês estão fazendo esse dossiê, mas é admiração incrível. É um dos últimos, é um dos últimos honestos, é um dos últimos íntegros, é uma das últimas pessoas de uma retidão incrível dentro do cinema brasileiro.

Celso Sabadin é presidente da comissão julgadora de cinema do IBAC, crítico de cinema do Cineclick, da Revista de Cinema, do Planeta Tela (consultoria e assessoria de imprensa dele), da Rádio Band e da TV Cultura.

Depoimento: Arlete Montenegro

Dossiê Alfredo Sternheim

O Alfredo é uma pessoa muito inteligente, um excelente profissional, uma pessoa que não faz filmes há muito tempo, mas que foi um grande diretor de cinema. Ultimamente não deu para ele fazer filmes, ele não faz há muito tempo, porque foi ficando difícil e ele acabou abandonando. O sonho dele é fazer um filme ainda, porque agora voltou o cinema com tudo. O grande problema é captar recursos.

Ele é uma pessoa muito amiga minha, muito amorosa, todas as pessoas gostam demais dele. Ele sabe tudo de cinema, tudo que você perguntar para ele, ele sabe. Tanto que quando ele não fez mais filmes, ele passou a ser jornalista especializado em crítica de cinema. Todo mundo quando quer saber alguma coisa sobre cinema, mesmo os colegas, escritores, jornalistas, recorrem a ele, porque ele sabe tudo.

Ele escreveu o livro da minha vida, a minha biografia.

Quero te contar uma coisa sobre o Alfredo. O Alfredo é uma pessoa tão querida, que uma vez eu quebrei a perna e fiquei quatro meses com ela engessada. E imagina você que quem me levava ao hospital toda semana, e tinha que me levar no colo até o carro, porque tinha uma obra na porta da minha casa, na Estação do metrô Marechal Deodoro, era o Alfredo! Que amigo! Isso é inesquecível, não é? Ele largava tudo o que estava fazendo para ir comigo e ficava no hospital o dia inteiro, na Santa Casa, naquela época eu estava sem plano de saúde e foi tudo lá. Olha, jamais eu vou me esquecer disso. Eu moro na praça, nós ficamos sem calçada e não tinha como parar carro, não tinha como fazer nada. Ele, o Antonio Carlos e um outro amigo meu, o Sergio Buck, me levavam no colo até a esquina onde estava parado o carro dele. Eles me levavam toda semana, olha só. A gente se gosta muito.

Arlete Montenegro é atriz e uma das amigas de Alfredo Sternheim.