Entrevista: Astolfo Araújo – Parte 1

Dossiê Astolfo Araújo
Parte 1 – infância, literatura, cinema, encontro com Biáfora

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Entrevista com Astolfo Araújo

Por Gabriel Carneiro
Fotos de Adriana Câmara

Zingu! – Como era sua infância?

Astolfo Araujo – Nasci em Ribeirão Preto, mas cresci em São Paulo. Meu pai era militar, da Força Pública. Vim pra cá com uns dois ou três meses. Minha infância era normal, boa pra mim. Estudei em escolas públicas, que eram muito boas. Cresci na Pompéia. Lia desde pequeno, mas ia pouco ao cinema. Depois entrei na Faculdade de Direito da São Francisco (USP), mas nunca tive interesse em exercer a profissão.

DSC04656-300x225Z – Foi lá que surgiu o interesse pela literatura?

AA – Tinha um pessoal que fazia literatura – fui colega inclusive do Raduan Nassar – e me meti no meio. Lá fundei a revista de literatura Escrita, com o Waldyr Nader e Hamilton Trevisan.

Z – E pelo cinema?

AA – Com 24 anos, fui começar a ir ao cinema; via de tudo. Frequentava muito os cinemas japoneses, na Liberdade. Gostava muito, me influenciou muito. Gostava de Kenji Mizoguchi, Tomu Uchida, Yasujiro Ozu, Kon Ichikawa, Shoji Matsumura, Heinosuke Gosho. Lá que conheci o Rubem Biáfora e iniciei nossa amizade. Não o lia, a princípio. Fui ler só depois. Quando o conheci, já queria fazer cinema. Fazia documentários pra algumas companhias produtoras. Fiz um documentário que ele assistiu e foi me cumprimentar. Nós freqüentávamos o Bar Costa do Sol, na Sete de Abril.

Z – Como foi fazer esses documentários?

AA – Tinha um rapaz que mexia com cinema e me disse que tinha um montador precisando de assistente. Fui lá. O montador era o Sylvio Renoldi. Através dele, comecei a montar filmes e a mexer com documentários, nessa empresa documental. Eu tinha amizade com o Roberto Santos e logo fui chamado pra fazer a assistência de direção de A Hora e a Vez de Augusto Matraga. Conheci o Biáfora depois.

Z – E como era trabalhar com o Roberto Santos?

AA – Muito complicado. Muito. Não fiquei até o final. Ele, que fez pela produtora dele, exigia todas as condições de set hollywoodiano, tudo minimamente planejado. Simplesmente não conseguíamos manter isso, por questões de produções limitadas que tínhamos. O Matraga tinha pouco dinheiro.

Z – Depois foi trabalhar com o Biáfora?

AA – Encomendaram a ele um documentário sobre um pintor famoso. Era para o INC. Deu certo e continuamos a trabalhar juntos. Foi nessa época que DSC04673-300x225montamos a Data Cinematográfica. Acho que foi 1966.

Z – Foi nessa época que ele virou seu cunhado?

AA – Foi depois (risos). Ele frequentava muito minha casa, e lá conheceu a irmã da minha ex-mulher, a Eva.

Z – Como era o Biáfora no dia a dia?

AA – Ótimo, ótimo! Estive nessa semana [em dezembro de 2011] no Rio com o produtor Pedro Rovai e ele me disse que aquele cineasta e crítico, Gustavo Dahl, antes de morrer, fez um artigo falando de quando conheceu o Biáfora, que era uma pessoa incrível. No set, era tranqüilo. Como todo diretor, tinha seus ataques, mas era boa pessoa.

Z – O primeiro longa que fizeram juntos foi O Quarto, do Biáfora, em que você é o produtor executivo.

AA – O filme não tinha nada de dinheiro (risos). Cinema brasileiro, na época, era todo arranjado. Minha função era administrar o dinheiro. Costumava ir ao set. O Biáfora era muito meticuloso, o filme teve bastante tempo de preparação.

Z – Como foi a escolha da equipe?

AA – Biáfora, muito por conta da atividade crítica dele, era muito respeitado. Todo mundo queria trabalhar com ele.

Z – E a do elenco?

AA – Ele não gostava de fazer teste. Eram pessoas que ele imaginava para o papel e chamava.

Z – O Ewerton de Castro, em entrevista, comentou que fez teste.

AA – Não teve teste não.

Z – O filme deu lucro?

AA – Deu lucro, mas o dinheiro sumiu, desapareceu. Não tínhamos controle de nada, acabamos não ganhando nada. Vi na Ancine agora, que tem a relação de bilheterias, que o meu filme As Gatinhas, quando foi lançado em 1970, fez mais de 600 mil espectadores. Imagine! Não vi um tostão.

Parte 2