O Último Êxtase

Dossiê de Aniversário: O Autor e a Musa – Walter Hugo Khouri e Lilian Lemmertz

 

O Último Êxtase
Direção: Walter Hugo Khouri
Brasil, 1973. 

Por Sérgio Andrade 

Marcelo, o alterego de Walter Hugo Khouri, apareceu ao longo dos anos em diversas fases da vida: criança e adolescente em Eros e Paixão Perdida, universitário em As Amorosas, adulto em Paixão e Sombras, O Prisioneiro do Sexo, Convite ao Prazer, Eros, Eu. Em O Último Êxtase ele é visto numa idade complicada: 18 anos. 

Logo no início, após a saída da mãe (da qual só ouvimos a voz), Marcelo (o filho de Khouri, Wilfred) pega o dinheiro do cofre, um revolver e deixa um recado na porta dizendo que sumiria por um tempo e pedindo que não o procurassem. 

Ele entra no jipe do amigo Jorge (Ewerton de Castro), pegam as namoradas e vão acampar no meio de uma floresta, onde Marcelo relembra aos amigos de uma época, quando criança, em que acampou naquele mesmo lugar com o pai, a mãe e os irmãos. Um momento de felicidade em sua vida, no qual dormiu no meio dos pais e onde até mesmo a forte chuva que caiu trazia boas lembranças, e que nunca mais se repetiu. Percebemos então que Marcelo quer recuperar aquele tempo perdido. No primeiro dia tudo dá certo, eles montam a barraca num dia ensolarado, se banham no rio (a água, alias, é um elemento constante no filme) e Marcelo faz amor pela primeira vez com Luci (Ângela Valério). 

No dia seguinte, porém, fica claro que aqueles tempos não voltam mais: o céu está nublado, Marta (Dorothee Marie Bouvier), namorada de Jorge, deixa claro que não suporta Marcelo; Luci, na sua insegurança dos 18 anos, demonstra não ser um porto seguro; e de noite cai um temporal que derruba a barraca. Para piorar, eles ouvem barulhos e se sentem observados por alguma coisa escondida no meio das árvores. Mas os verdadeiros predadores surgem na figura de um casal maduro, representado por Lilian Lemmertz e Luigi Picchi, que acampam no mesmo lugar, no seu enorme trailer super-equipado. Com seus modos sofisticados, história de vida interessante (o homem diz ter sido prisioneiro num campo de concentração), facilmente eles encantam os jovens, com exceção de Marcelo. O homem seduz Marta, enquanto a mulher faz o mesmo com Jorge entre as árvores (cena criminosamente cortada pela censura). Já Luci também se sente atraída por aquele estilo de vida, se revoltando com o jeito possessivo de Marcelo até se afastar dele de vez. 

Contando com a companhia de colaboradores habituais (fotografia de Antonio Meliande, montagem de Sylvio Renoldi, música de Rogério Duprat), e interpretações consistentes de todo o elenco, Khouri realiza aqui um de seus filmes mais bucólicos e ao mesmo tempo mais cruéis. Na primeira decepção amorosa com os seres humanos do jovem Marcelo, pode estar a chave para a compreensão do predador sexual que se transformaria em adulto. 

No final, ele volta para casa, sozinho, e a montagem alterna cenas do pessoal passeando de barco na represa, felizes da vida, enquanto Marcelo se martiriza deitado na lona de um caminhão, de onde avista a chegada da cinzenta São Paulo da qual será um eterno prisioneiro.