A Herança dos Devassos

Dossiê Alfredo Sternheim

A Herança dos Devassos
Direção: Alfredo Sternheim
Brasil, 1979.

Por Adilson Marcelino

A Herança do Devassos (1979) foi uma produção conturbada na carreira de Alfredo Sternheim. Co-produção Brasil/Argentina, o filme foi dirigido por César Cabral e Sternheim, sendo que os dois se desentenderam durante as filmagens. Em depoimento para esta edição comemorativa da Zingu!, Elisabeth Hartmann, uma dos protagonistas do filme, disse que nem sabia como Cabral podia ser o diretor, já que ele não entendia nada.

O próprio Alfredo elucida um pouco sobre os bastidores da produção em depoimento ao Dicionário de Filmes Brasileiros – Longa Metragem, de Antonio Leão da Silva Neto: “O filme foi escrito e produzido em sua maior parte financeira por César Soares Cabral, peronista ferrenho,que atuou como supervisor. Daí não ter boas lembranças da filmagem.Só no meio da filmagem eu soube: ele havia sido secretário de cultura de Isabelita Peron; a confissão se deu quando ele se ofendeu comigo por ter cantarolado Don´t Cry For me Argentina. Tivemos divergências e não gosto de lembrar as filmagens”.

Confusões à parte, A Herança dos Devassos é filme belíssimo, com todo um clima doentio de perversão, incesto e sombras que circundam uma família disfuncional. Mais de uma vez Alfredo Sternheim já disse que Walter Hugo Khouri, com quem trabalhou em A Ilha (1961/63) e Noite Vazia (1964), foi sua verdadeira escola. Mas sempre faz questão de dizer também, como na entrevista exclusiva para esta edição da Zingu!, que seu cinema é bem diferente do mestre. Com certeza porque é mesmo, e também por causa de uma certa parte de uma crítica implicante, que o denominava um sub-Khouri no início da carreira.

Só que nesse caso aqui é impossível não se lembrar do mestre, seja por causa da presença de Sandra Bréa e Roberto Maya, dupla dos inesquecíveis O Prisioneiro do Sexo (1979) e Convite ao Prazer (1980), seja pela forma como filma suas atrizes, Bréa e Elisabeth Hartmann, em imagens belíssimas – a direção de fotografia e a camera é do craque Antonio Meliande.

A Herança dos Devassos tem como tema central a degradação de uma família aristocrática. Quando a matriarca morre, o casal de filhos, uma tia, e o mordomo recebem a visita da viúva de um primo, que vem para o velório e para a abertura do testamento. Inadvertidamente, essa prima Délia, interpretada por Sandra Bréa, envolve-se amorosamente com Rogério, vivido por Roberto Maya, um dos filhos da falecida. Esse fato despertará a ira de Laura, interpretada por Elisabeth Hartmann, que mantém uma relação quase incestuosa com o irmão. Délia acaba por descobrir os segredos e os fantasmas que rondam aquela família e aquela casa, e quando resolve ir embora se vê presa em uma teia que poder lhe custar a própria vida.

O elenco, que conta ainda com Francisco Cúrcio, Claudette Joubert, Ricardo Dias, Mara Prado e Edward Freund, está sensacional. Mas é realmente no trio protagonista em perfeita sintonia, que esse A Herança dos Devassos encontra seu ponto alto.

Belo filme.

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