Entrevista com Francisco Ramalho Jr. – parte 3

Dossiê Francisco Ramalho Jr.

Entrevista com Francisco Ramalho Jr.
Parte 3: Anos 1980, depois da entrada do cinema de sexo explícito

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O produtor Francisco Ramalho Jr., o diretor Hector Babenco e equipe em Coração Iluminado (1998)

Por Gabriel Carneiro

Zingu! – Qual papel que a entrada do cinema de sexo explícito teve no cinema brasileiro e mais especificamente no seu cinema?

Francisco Ramalho Jr. – Bem, o erotismo que comentei começou a se degenerar com a abertura democrática, pois chegaram filmes com cenas de sexo explícito (Calígula, por exemplo, entre outros) que estavam proibidos no Brasil e os exibidores se voltaram aos produtores pedindo o mesmo. Nunca tive cenas de sexo explicito em meus filmes pelo que entendo como tal, mas se um determinado filme que venha a fazer necessite de alguma cena assim, eu a farei sem preconceitos.

Z – Como você conheceu o Hector Babenco e o que te levou a produzir filmes dele e vice-versa?

FR – Conheci o Hector à porta do atual cine Belas Artes, enquanto passava seu primeiro filme em pré-estréia. Desde então nasceu uma amizade e uma parceria profissional em mão dupla. Foi um período imensamente criativo e produtivo, cresci e aprendi muito, juntos fizemos grandes filmes além de continuar e consolidar uma amizade que começara muito antes, que está viva até hoje.

Z – Como surgiu Besame Mucho?

FR – Ao assistir à peça do Mario Prata, vi nela a oportunidade de falar de minha geração como tentara antes com o Paula, só que de um ponto de vista mais leve, com um sorriso nos lábios. O filme ficou.

Z – Como se deu a escolha do elenco?

FR – Gosto muito de dirigir atores dando-lhes muita liberdade de criação. Precisava de grandes atores para caracterizar grandes personagens e não foi fácil chegar a um elenco tão extraordinário: José Wilker, Gloria Pires, Antônio Fagundes, Christiane Torloni, Paulo Betti e Giulia Gam. Uau! Não fiz testes de elenco – à época não se fazia isso no Brasil. Pensei e entrevistei atores e atrizes possíveis, até chegar ao elenco do filme.

Z – Você quis que o filme dialogasse, esteticamente, com as produções paulistas dos anos 80, como Cidade Oculta, e outros?

FR – Quando faço um filme não oriento a criação para um coletivo como você sugere. Faço o meu filme e se ele vier a representar algo, será apontado pelos estudiosos. Você citou o Cidade Oculta, do Chico Botelho, que é um grande filme e feito por um amigo meu, que se foi muito cedo – mas não vejo paralelo entre os filmes a não ser que alguém possa fazê-lo.

Z – Você vê o longa como um balanço dos anos de Regime Militar?

FR – É uma história de geração que viveu parte de sua vida durante o regime militar, e creio que seria pretensioso pensá-lo como balanço desse regime de exceção democrática.

Z – Quanto ele custou e por quantas pessoas ele foi visto nos cinemas, na época?

FR – O Besame Mucho foi uma produção de um custo não baixo, ainda que tenha sido feito em sete semanas de filmagem, mas tinha grandes atores, um filme em épocas diversas, uma grande trilha do Wagner Tiso, uma quantidade razoável de negativo, etc. Foi muito bem de público, mais de 1 milhão de espectadores, o que era muito para a época.

Z – Como era a produção paulista dos anos 80, especialmente a de novos diretores, como André Klotzel, Guilherme de Almeida Prado e outros? Você diferenças deles para o cinema feito na época?

FR – Talentosa como continua a ser atualmente com esses diretores citados que continuam a filmar e com o surgimento de outros criadores, que, como os citados, orquestram uma obra que registra civilizatoriamente comportamentos brasileiros, bem como, no particular, os múltiplos aspectos da vida paulistana. Amo e venero o cinema brasileiro, minha razão de ser. Evidentemente, cada criador é diferente dos demais, bem como as obras do mesmo criador se modifica a cada nova criação.

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