Dossiê Francisco Ramalho Jr.
Por Adilson Marcelino
Produtor, cineasta e roteirista, Francisco Ramalho Jr. é nome fundamental na história do cinema brasileiro.
Nascido em 1940, em Santa Cruz das Palmeiras, São Paulo, Francisco Ramalho Jr. passou a infância em Pirassununga, também interior paulista. Foi lá que nasceu a paixão pelo cinema, assistindo aos seriados no cinema e criando histórias e exibindo para os amigos em projetor doméstico improvisado. Mais tarde, fica ainda mais íntimo do cinema quando cursa a Politécnica e dirige o Centro Acadêmico, e depois vai trabalhar na Cinemateca Brasileira, em época do grande Paulo Emílio Salles Gomes.
Depois das brincadeiras de garoto, a primeira experiência como realizador é no formato Super-8. Em 1964, dirige o curta Teatro Popular, em 1967, Mal de Chagas, e em 1974, Tietê – além de assistência de montagem nos curtas Subterrâneos do Futebol (1965), de Maurice Capovilla, e Auto da Vitória (1966), de Geraldo Sarno.
Em 1968, Francisco Ramalho Jr. estreia em longas com o filme Anuska – Manequim e Mulher. Adaptado do conto Ascensão ao Mundo de Anuska, do livro Depois do Sol, e em dois contos não publicados de Ignácio de Loyola Brandão, que assina os diálogos, o filme fala de uma história de amor e de ciúme entre um jornalista, vivido por Francisco Cuoco, e uma modelo, vivida por Marília Branco. Situado no mundo da moda, Anuska – Manequim e Mulher é uma estreia com estilo e que possibilita rara oportunidade de ver Francisco Cuoco no cinema, já que o ator retomaria sua carreira nas telas só a partir da década de 1990.
Francisco Ramalho Jr. ficaria quase uma década sem dirigir longas, pois foi a época barra pesada da ditadura militar, época em que trabalhou em outras frentes, como professor de física e diretor do Museu Lasar Segall. O retorno se dá com À Flor da Pele (1976), filme de sucesso e vencedor de vários prêmios – Melhor Filme, Melhor Atriz (Denise Bandeira), e Melhor Roteiro (Ramalho) no Festival de Gramado 1977, e Prêmio Especial Air France de Cinema 1976 para Denise Bandeira. O filme, baseado em peça de Consuelo de Castro, conta a tumultuada história de amor entre um autor de telenovelas, Juca de Oliveira, e sua aluna na Escola de Artes Dramáticas, Denise Bandeira. Em 1976, dirige também o episódio Joãozinho, do longa Sabendo Usar Não Vai Faltar, uma produção de Alfredo Palácios e Antonio Polo Galante.
Em 1978, Ramalho dirige o maior sucesso de sua carreira e, curiosamente, o único longa que não tinha produzido até então, O Cortiço. Adaptado da obra-prima naturalista de Aluísio Azevedo, O Cortiço é uma super produção para a época e bancada pelo produtor Edgar de Castro. O filme reúne nas telas um dos casais mais explosivos daquele momento, Betty Faria e Mário Gomes, que vinha da novela de sucesso Duas Vidas (1976/77), de Janete Clair, e de separação bombástica entre Betty e o diretor Daniel Filho. O Cortiço não tem a força do romance, mas conta com bom elenco – ainda tem Armando Bógus, Marcus Vinícius, Ítala Nandi, Jacyra Silva, Beatriz Segall, Zaira Zambelli, Sílvia Salgado; e belíssima música de John Neschling – a canção Rita Baiana na voz de Zezé Motta foi sucesso nas rádios.
Com Paula – A História de uma Subversiva (1979), Francisco Ramalho Jr. faz seu filme mais pessoal. Pela primeira vez escreve uma história original, o reencontro entre um arquiteto e seu antigo torturador na época da ditadura e as lembranças de um antigo amor morto pelo regime, e que tem muita a ver com a vivência de Ramalho – durante a ditadura ele foi preso duas vezes. O filme marcou também a primeira co-produção com a Embrafilme, que ainda fez a distribuição. Paula – A História de Uma Subversiva é protagonizado por Walter Marins – o arquiteto Marco Antonio e ex-professor da Faculdade de Arquitetura da USP -, Armando Bógus – Oliveira, ex-torturador e atual chefe do setor de entorpecentes da polícia -, Carina Cooper – Paula, líder estudantil que integra a luta armada -, Regina Braga – fotógrafa e esposa de Marco Antônio -, e Marlene França – professora infantil e ex-esposa do arquiteto. Quando a filha de Marco Antônio desaparece, ele reencontra seu ex-torturador, agora designado pela polícia para encontrar o paradeiro da moça. Esse episodio faz Marco Antonio relembrar o passado e seu caso de amor com Paula, líder estudantil caçada ferozmente por Oliveira. Paula – A História de Uma Subversiva é um bom filme, mas fracassou totalmente nas bilheterias.
Nos anos 1980, dirigiu o cultuado Filhos e Amantes (1981), produzido por Antonio Polo Galante. O filme conta o encontro em uma casa nas montanhas de vários personagens e as conseqüências que vão originar daí. Sexo, homossexualidade, drogas e amor livre em elenco com Lúcia Veríssimo, Denise Dumont, André de Biase, Nicole Puzzi, Hugo Della Santa, Rosina Malbouisson, Walmor Chagas e Renee de Vielmond. O outro filme da década é o sucesso Besame Mucho (1986), adaptado da peça homônima de Mário Prata. O filme conta, de trás para frente, a história de dois casais – Antônio Fagundes e Christiane Torloni, José Wilker e Glória Pires – desde a adolescência até a tumultuada vida de casados. Sucesso popular, Besame Mucho foi premiado no Festival de Gramado 1987, como Melhor Roteiro (Prata e Ramalho), e no Festival de Cinema Íbero-Americano de Huelva, Espanha, 1987, como Melhor Filme.
Depois de Besame Mucho, Francisco Ramalho fica longe da carreira de cineasta por quase duas décadas, retornando em 2006 com Canta Maria. Adaptado do romance Os Desvalidos, de Francisco J. C. Dantas, o filme conta uma história de amor e ciúme no nordeste povoado por cangaceiros e volantes. No elenco, Vanessa Giácomo, Marco Ricca, José Wilker e Edward Boggiss.
Além da carreira de diretor, Francisco Ramalho Jr. tem também importante carreira de produtor, não só de seus filmes mais de inúmeros outros cineastas. A parceria mais bem sucedida foi com Hector Babenco, que começou com o sucesso internacional de Babenco, O Beijo da Mulher Aranha (1985) – Oscar de Melhor Ator e prêmio de Melhor Ator no Festival de Cannes para William Hurt, além de outros prêmios na Noruega, Japão, Espanha e Estados Unidos. Ainda com Babenco, Ramalho produziu Coração Iluminado (1998).
Francisco Ramalho Jr. participou de várias produções, como produtor ou produtor executivo, de filmes como Os Amantes da Chuva (1980), de Roberto Santos; Das Tripas Coração (1982), de Ana Carolina; Cristina Quer Casar (2003), de Luiz Vilaça; Jogo Subterrâneo (2004), de Roberto Gervitz; O Casamento de Romeu e Julieta (2005), de Bruno Barreto; O Contador de Histórias (2009), de Luiz Villaça; e acaba de chegar sua nova produção aos cinemas, a volta de Arnaldo Jabor, A Suprema Felicidade.
Fontes:
Livros: Dicionário de Cineastas Brasileiros (Luiz F. A. Miranda), Dicionário de Filmes Brasileiros – Longa Metragem (Antonio Leão da Silva Neto)
Documentário: Francisco Ramalho Jr. (André Barcinski)
Sites: Mulheres do Cinema Brasileiro, Insensatez e IMDb