As Safadas

Dossiê Carlos Reichenbach

As Safadas (ep. A Rainha do Fliper)

Direção: Carlos Reichenbach

Brasil, 1982.

Por Gabriel Carneiro

(Pode conter spoilers)

Primeiro dos três episódios de As Safadas, produção de A. P. Galante, A Rainha do Fliper é uma interessante brincadeira de Carlos Reichenbach. Deixando de lado o discurso mais politizado, o cineasta se solta dentro do gênero da comédia erótica, fazendo uma exemplar produção. Não que os conflitos dos personagens não existam – estão lá e são expostos -, mas o encadeamento do episódio nos leva ao deboche dos personagens-tipos, que assolavam os filmes da Boca.

O filme começa quando Tesinho vai a uma casa de jogos eletrônicos em busca de Reginéia, conhecida como “a rainha do fliper”. Sem se verem há muitos anos, Reginéia larga o fliperama – renda dela e de seu namorado cafajeste -, para conversar com ele. Surge então para a rainha o conflito entre um homem certo e bom (Tesinho) e o típico cafajeste (o namorado). O interessante é que, à medida que passa, parece que a opção será a óbvia – afinal, toda moça quer se acertar na vida, com um homem certo. O cineasta não quer saber disso. Evoca o marginal e o deboche, e um certo conformismo por parte dos personagens, para quebrar com o óbvio.

A rainha, que largara a família, para viver na clandestinidade moral com o cafajeste, arrepende-se. Ela quer um futuro diferente – mas quem disse que o futuro lhe reserva isso? O mais próximo da decência moral vem de um fracassado, abandonado pela mulher e filho, vivendo num hotel de quinta categoria, que, queira-se ou não, era a esperança que o público masculino que com ele se identifica tinha – não é todo dia que se consegue uma beldade como Zilda Mayo. Entremeado pela nudez da atriz, a conclusão parece ser que o caminho é um só. Um final conformista e não por isso menos poético. É a impotência do ser humano diante de seu futuro. Tudo continua igual.

Mesmo aqui, uma notória pornochanchada, o que parece guiar o episódio é a angústia feminina – aspecto marcante na carreira de Reichenbach. Vemos também a exuberante Zilda Mayo, a todo momento, sendo referenciada como “a rainha”. Rainha do que? Do fliper, (do sexo) e é isso. Ela se resume a uma banalidade. Ela se enxerga sem importância alguma – de que vale ser excelente no fliperama, se toda sua vida está errada.

A Rainha do Fliper é sucedido pelos episódios Uma aula de Sanfona, estréia (e única experiência) de Inácio Araujo na direção, e Belinha, a virgem, de Antonio Meliande, numa rara combinação de episódios igualmente bons. Ressuscitado pelo Canal Brasil, As Safadas merece ser assistido.