Anjos do Arrabalde – As Professoras

Dossiê Carlos Reichenbach

Anjos do Arrabalde – As Professoras

Direção: Carlos Reichenbach

Brasil, 1987.

Por Ailton Monteiro, especialmente para a Zingu!*

Uma das coisas mais admiráveis no cinema de Carlos Reichenbach, carinhosamente conhecido como Carlão, é a sua aproximação com a alma das mulheres. Grande parte de seus filmes é narrada pelo ponto de vista feminino. Elas são mostradas em sua fragilidade, mas principalmente em sua força e independência. Anjos do Arrabalde (1987) antecipa o que o cineasta mostraria em trabalhos mais recentes – Garotas do ABC (2004) e Falsa Loura (2008) – embora na comparação com esses dois, o mais premiado dos filmes de Carlão saia perdendo.

Hoje visto, Anjos do Arrabalde parece uma matéria bruta, distante da elegância e da fluidez narrativa dos dois outros trabalhos citados que abordam o universo feminino. Talvez o fato de ter personagens demais para lidar tenha sido um problema. É um filme-painel que nem sempre funciona. Embora lá pelo final o filme quase dê conta desses personagens, a impressão é de que algo saiu do controle. Principalmente quando o final trágico não convence ou não traz a catarse necessária.

Mesmo não estando entre as melhores obras de Carlão, Anjos do Arrabalde tem os seus momentos inspirados. A maior parte deles nas cenas em que Betty Faria aparece. Ela interpreta uma professora que tem a fama de ter uma vida sexual um pouco diferente. Talvez lésbica, pensam alguns. Outra personagem-chave da trama é a manicure interpretada por Vanessa Alves, atriz que já havia trabalhado com Carlão em O Paraíso Proibido (1981), entre outros. Com o tempo, acabou se tornando uma espécie de musa do diretor, totalizando com ele cinco filmes.

Vanessa abre o filme como a jovem estuprada e agredida. A primeira imagem do longa é do sujeito levantando as calças, enquanto ela está caída no chão, num matagal. Logo depois, vemos um plano geral de um bairro da periferia de São Paulo, seguido dos créditos e da música no acordeon, que se tornaria marca de Anjos do Arrabalde. Inclusive, há uma cena interessante em que Clarice Abujamra põe um disco para tocar de um tal Carlão do Acordeon. Na capa do disco, vemos uma foto do próprio diretor, em momento hitchcockiano. Outros momentos que são bem a cara do cineasta são a citação ao poeta Jorge de Lima e as homenagens aos cineastas Luís Sérgio Person – que dá nome à escola do filme – e Shohei Imamura.

Anjos do Arrabalde ganhou três prêmios no festival de Gramado: melhor filme, melhor atriz (Betty Faria) e melhor atriz coadjuvante (Vanessa Alves).

*Ailton Monteiro é cinéfilo de carteirinha e editor do blog Diário de Um Cinéfilo, premiado com o Quepe do Comodoro de melhor blog em 2004.