Por Antonio Leão da Silva Neto
Alguém com certeza fez essa pergunta à Afonso Segreto em 1898, talvez no dia 19 de junho, ou talvez ainda a bordo do navio Brèsil, quando este acionava seu equipamento recém- adquirido na França dos irmãos Lumière para tomar imagens da Baía da Guanabara, no Rio de Janeiro.
112 anos depois, essa pergunta ainda está no ar. Mas vejamos: o que é Cinema Brasileiro pra quem não vê filmes brasileiros há muitos anos? pra quem nunca viu?, pra quem critica sem saber?, pra quem achincalha sem conhecer?. Para esses, com certeza o cinema brasileiro não é nada, não vale nada e nunca será nada, haja visto que ouvimos até hoje, décadas depois, que o Cinema Brasileiro é só mulher pelada, sexo e sacanagem.
Pra essas pessoas e para todas aquelas que duvidam de sua própria capacidade, ou que aplaudem enlatados importados, permitindo a evasão de milhões de dólares que seguem mensalmente para as majors americanas eu digo: O Cinema Brasileiro é paixão, fé, capacidade, talento, adrenalina e obstinação. Mas hoje nos falta o principal: o reconhecimento do público. Produzimos filmes de excelente qualidade, que não fica nada a dever a nenhum cinema do mundo, mas quase ninguém os vê, pois eles percorrem os festivais, privilegiando uma pequena e seleta parte do público, depois vão esquentar as prateleiras das distribuidoras, aguardando uma janela, entre um filme e outro estrangeiro. E nesse quesito, os números não mentem.
Há algum tempo, aliás, pouco tempo atrás, três filmes estrangeiros dominavam 97% das 2200 salas brasileiras. Podemos e devemos mudar esse quadro através de uma forte ação governamental que possibilite que nossos filmes cheguem às telas, inclusive através de campanhas em todas as mídias, incentivando o brasileiro a ver filme brasileiro. Uma nova cultura deve ser fomentada.
Será que nosso passado não nos recomenda? Os primeiros passos com verdadeiros desbravadores como Segreto, Silvino Santos, Leal, Rossi, Cappelaro, Botelho, Bonfioli, etc; o pioneirismo da Cinédia de Adhemar Gonzaga dos anos 1930/40; a popularidade da Atlântida e o glamour da Vera-Cruz dos 50; o experimentalismo do cinema novo e do cinema da boca de São Paulo nos 60; a pornochanchada dos 70; e, finalmente, a retomada a partir dos 90? Seria correto e justo desmerecer o talento de Humberto Mauro? Carlos Manga?, Anselmo Duarte? Nelson Pereira dos Santos? José Mojica Marins? Carlos Diegues? Glauber Rocha? Walter Salles? Carlos Reichenbach? Walter Hugo Khouri? Fernando Meirelles? e tantos e tantos outros?
A aventura de se fazer cinema no Brasil requer muitas qualidades de quem o pretende, não é uma tarefa fácil nem para qualquer um.
A aventura de se fazer cinema no Brasil requer sacrifícios pessoais e financeiros. Muitos cineastas pagam dívidas de seus filmes por décadas e por vezes morrem sem ver a obra pronta, raramente enriquecem.
Então… há de se respeitar quem faz, quem realiza, quem tem a preocupação de mostrar a nossa realidade, nossa brasilidade nas telas e não nos impingir goela abaixo outras realidades que não nos dizem respeito.
Enfim, ao povo o que é do povo, cinema futebol e cachaça. Essa explosiva combinação nos leva a conclusão que, retornando à pergunta inicial, o cinema brasileiro hoje poderia ser representado por uma arvore frondosa e baixa, cheia de grandes galhos carregados de frutos doces e macios, à espera de alguém que por eles se interessem e os queiram degustar.
Antonio Leão da Silva Neto é pesquisador cinematográfico e autor dos livros Dicionário Astros e Estrelas do Cinema Brasileiro, Dicionário de Filmes Brasileiros- Longa-metragem, Dicionário de Filmes Brasileiros – Curta e Média-metragem, Ary Fernandes, sua Fascinante História, e Miguel Borges, um Lobisomem sai da Sombra.