Especial A Aids no Cinema Brasileiro
Cinema de Lágrimas
Direção: Nelson Pereira dos Santos
Brasil, 1995.
Por Adilson Marcelino
Um dos gigantes do cinema brasileiro, Nelson Pereira dos Santos tem filmografia extensa e marcada por ótimos filmes – alguns verdadeiras obras-primas – e poucos outros de menor relevância. Injustamente, Cinema de Lágrimas é quase sempre alocado nesse último time.
Nelson sempre pensou o país por diferentes abordagens, seja pela literatura, religião, cultura popular e erudita. Em Cinema de Lágrimas, ele se debruçou sobre todo um ideário da América Latina: o melodrama. Com roteiro seu e de Silvia Oroz, e baseado no livro dela, Melodrama: O Cinema de Lágrimas da América Latina, o filme integrou projeto comemorativo do British Film Institute para os 100 anos do cinema naquele 1995.
Na trama, Raul Cortez é um ator e diretor de teatro em crise, Sua última peça fracassou e ele se dá férias para se afastar de tudo e de todos. Um fato trágico marca sua vida e o atormenta dia e noite: o suicídio de sua mãe – bela aparição de Christiane Torloni – quando ele tinha apenas quatro anos.
Para enfrentar seu tormento, ele empreende uma pesquisa sobre os melodramas da década de 40, uma das paixões da mãe, e sai a campo para aplacar sua dor emocional e psicológica. O endereço primeiro é a Cinemateca do MAM, onde o saudoso Cosme Alves Neto o orienta a procurar material na Universidade Autônoma do México, endereço essencial para seu intento.
E é para a terra do melodrama que ele vai, levando junto como assistente um jovem interpretado por André Barros, com quem vai iniciar fugidia e atormentada relação de trabalho e atração. Daí, os dois assistem, juntos ou não – nem sempre o jovem aparece, para desconforto crescente de Raul -, vários melodramas em p&b protagonizados por estrelas como Maria Félix, que irrompem na tela também para nosso deleite.
Enquanto as cenas são apresentadas na tela, Barros situa os fundamentos do gênero que marcou grande parte do continente, e de forma muito forte o Brasil. Um dos elementos focalizados pelo melodrama são as doenças fatais, e o filme faz interessante desdobramento histórico entre os grande males que assolaram/assolam a humanidade: a tuberculose, o câncer, e a Aids.
Ao trazer um tema urgente e pouco abordado pelo cinema brasileiro, tanto da época como ainda nos dias de hoje – a produção é dos anos 90 – Nelson Pereira dos Santos focaliza a Aids e os soropositivos com respeito e humanidade.
E é esse olhar do grande mestre para a tragédia de nosso tempo e suas vítimas, mais as imagens acachapantes das cenas dos melodramas exibidos dentro do filme, que marcam com encanto esse subestimado Cinema de Lágrimas.