Especial Boca Pornô – 30 anos
O Ônibus da Suruba
Direção: Sady Baby e Renato Alves
Brasil, 1990
Por Leo Pyrata
O Ônibus da Suruba é um dos filmes mais singulares da fase terminal do explicito da Boca do Lixo. Sady Baby e Renalto Alves produziram esse petardo da cinematografia brasileira. O ônibus da suruba atravessa o Brasil soltando a franga com sua trilha sonora desconcertante combinando Beto Barbosa e Flash Dance numa orgia itinerante de delitos e putaria.
Partindo da premissa da Lei do Cascão, em que “trabalhar é pra otário e que se esse país é uma foda então vamos fudê”, Cascão (Sady Baby) reúne um exercito de Brancaleone para seu épico da picaretagem. Um roadie movie pornô orquestrado pela lei do Cascão. Cascão é um mestre de cerimônias afinado com a tradição brasileira do apresentador grotesco de televisão. Ele cafetina o elenco para passar por peripécias de sexo, roubos e trapaças, financiando sua jornada atrás de um comparsa caloteiro.
O filme é feio, sujo e forte, principalmente pela distancia que se situa das convenções higiênico-eugênicas da fotografia publicitóide de produções contemporâneas como Bruna Surfistinha e outras bundas mais lindas da cidade. Negar a força cinematográfica de Onibus da suruba é como partir em defesa da ditadura do belo, programático, limpo e eficiente e se afinar com as carolas medianas da mercantiização doriana da imagem. Hoje mais que nunca trata-se de um filme belíssimo.
A montagem da seqüência da suruba da mexerica é um achado. Uma feijoada de planos mesclando caras e coitos com muita inventividade. Sady Baby transforma a pornografia em ficção investindo numa performance quase frontal, bancando o xerife da misé em scene, ditando ações e submetendo sua trupe à situações em quee o risco do real é muito mais que cinematográfico.O espetáculo sexual do filme está sempre operando nesse sentido. Existe nesse formato uma pulsão que aproxima sempre o sexo da violência e o prazer da morte. Os gritos do profeta Sady são pra que seus seguidores saibam que eles estão vivos.
E a nave de Sady vai, essa Atalante do desbunde putanhesco tupiniquim às margens do aceitável e na contramão das alamedas do bom gostismo, corrompendo freiras, casais e prejudicando os passantes de boa índole. Dessa jornada surge um filme rude e vigoroso com o melhor travelling pornográfico rodado no capô do ônibus em plena rodovia, a documentação da cagada que um ator dá pela janela também com o ônibus em movimento, junto com outras cenas antológicas como a de X-Tayla correndo em câmera lenta em frente as ruínas.Vários momentos brilhantes da fotografia de Renato Alves que, combinados com os registros sexuais enquadrados de forma seca e documental num ritmo que muitas vezes briga com a trilha sonora, consegue produzir uma experiência única de antipornografia. Provavelmente a mesma antipornografia que Nagisa Oshima procurava. No desfecho do filme Sady Baby tenta mas não consegue se livrar de sua trupe. No fundo ele sabe que é a suruba que bota seu ônibus pra andar.