Um cineasta de talento
Por Adilson Marcelino
Alfredo Sternheim começou a carreira cinematográfica aos 19 anos como assistente-continuísta de Walter Hugo Khouri em A Ilha (1961/3) e daí não parou mais. Na mesma época dirigiu seu primeiro filme, o curta-metragem Um Recanto Aprazível, um documentário sobre Bertioga, locação do filme, e a colônia de férias do Sesc naquela cidade do litoral paulista – Khouri destacou Sternheim para o trabalho, que tinha de ser feito para o Sesc como forma de pagamento pela hospedagem e do elenco e da equipe na colônia de férias em Bertioga.
Alfredo Sternheim voltaria a trabalhar novamente com Khouri como assistente de direção, dessa vez no clássico Noite Vazia (1964). Mas depois passaria a trabalhar em seus próprios projetos, mesmo porque logo depois de A Ilha, começou a trabalhar no jornal O Estado de São Paulo como crítico, levado pelo mítico Rubem Biáfora – Sternheim escreveu sua primeira crítica em 1863, sobre Cinco Vezes Favela (1962, Marcos Farias, Miguel Borges, Cacá Diegues, Joaquim Pedro de Andrade, e Leon Hirszman), e ficou por lá mais de quatro anos.
Os primeiros filmes de Sternheim como diretor são curtas, sendo todos eles documentários: Um Recanto Aprazível (1963); Noturno (1967); Flávio de Carvalho (1968); A Batalha dos Sete Anos (1968); O Ciclo Vera Cruz (1969); Museus de São Paulo (1970); Isei Nansei Sansei (1970) – depois, em meio aos longas, ainda dirigiu Vestígios de um Passado Esplêndido (1979); João Paulo II no Paraná (1980); A Matosul (1989); além do episódio de um longa inacabado, Aquelas Mulheres.
A estreia em longas foi em 1972 com Paixão na Praia, belo filme produzido pela dupla de ouro da Servicine, Alfredo Palácios e Antonio Pólo Galante, e protagonizado por Norma Bengell, Adriano Reys, Ewerton de Castro e Lola Brah. A personagem de Norma foi escrito para Eva Wilma, atriz que o cineasta conheceu e se tornou amigo em A Ilha, mas acabou nas mãos da grande e temperamental atriz com quem trabalhou em outro filme de Khouri, Noite Vazia. Paixão na Praia é filme corajoso, pois tem entrecho político em plena época brava de ditadura militar.
Mas é com o segundo filme que Sternheim encontraria o sucesso, e também muita dor de cabeça com a censura militar: Anjo Loiro (1973). Protagonizado por Vera Fischer e Mário Benvenuti, o filme é uma adaptação de conto de Henrich Mann – que já originara o clássico O Anjo Azul (1930), de Josef Von Sternberg, com Marlene Dietrich. Anjo Loiro é um dos melhores filmes do cineasta, e que ajudou a sedimentar a carreira da deusa Vera Fischer no cinema e no imaginário popular.
A partir daí, Alfredo Sternheim vai dirigir um longa atrás do outro, com a invejável marca de 26 filmes, sendo um deles um episódio – Gatas no Cio, de Sacanagem (1981), e 13 de sexo explícito. Corajosamente, nessa fase explícita Alfredo Sternheim assinou sem próprio nome, diferente de muitos colegas que adotaram pseudônimo, e por isso enfrentando ataques e descaso de boa parte da crítica. É dessa fase também sua associação com o produtor e cineasta Juan Bajon, que com sua Galápalos Produções Cinematográficas produziu quase todos os filmes de Sternheim nessa fase – como Alfredo, Bajon também não seu escondeu atrás de pseudônimo.
Alfredo Sternheim tem no currículo ainda outros grandes filmes como Pureza Probida (1974), Mulher Desejada (1978), A Herança dos Devassos (1979, co-direção de César Cabral), Violência na Carne (1980), Amor de Perversão (1982), Brisas do Amor (1982), Tensão e Desejo (1983), O Sexo dos Anormais (1984), Sexo Doido (1986) e Corpos Quentes (1987).
Tem também a produção histórica Lucíola, O Anjo Pecador, bancada por Palácios e Galante – representou o Brasil no IV Festival de Teerã -, e a ousada produção da Dacar, de David Cardoso, Corpo Devasso (1980), com um David sem pudor de atuar em cenas de sexo homossexual.
Assim como Walter Hugo Khouri e Carlos Reichenbach, Alfredo Sternheim também reservou ótimos personagens femininos para seus filmes. E como eles escalou verdadeiras deusas da Boca do Lixo. O cineasta fez protagonistas de suas tramas, musas como Vera Fischer, Rossana Ghessa, Kate Hansen, Sandra Bréa, Elisabeth Hartman, Neide Ribeiro, Helena Ramos, Alvamar Taddei, Sandra Graffi, Sandra Midori, Sandra Morelli e Ludmila Batalov.
Mas a galeria de musas não para por aí, pois trabalhou também com Ivete Bonfá, Marlene França, Claudette Joubert, Patricia Scalvi, Meiry Vieira, Sônia Garcia, Nádia Destro, Aldine Muller, Noelle Pine, Tássia Camargo, Lígia de Paula, Maria Stela Splendore, Zilda Mayo, Zélia Diniz, Aryadne de Lima, Gisa Della Mare, Silvia Dumont, Débora Muniz, Márcia Ferro.
No elenco masculino, trabalhou com os dois maiores galãs do cinema dos anos 1970, David Cardoso e Carlo Mossy, além da parceria habitual com o ótimo Luiz Carlos Braga.
Depois da derrocada da Boca do Lixo, Alfredo Sternheim abandonou a carreira de cineasta, mas não abandonou o universo do cinema, atuando como crítico em várias publicações.