Entrevista Juan Bajon

Dossiê Alfredo Sternheim

Juan Bajon fala sobre Alfredo Sternheim

Por Matheus Trunk

O cineasta e produtor Juan Bajon é um homem subestimado na história do cinema brasileiro. Realizador de filmes importantes como O Estripador de Mulheres e Colegiais e Lições de Sexo, o chinês radicado no Brasil sempre recebeu elogios por suas obras. Durante os anos 1980, Bajon produziu mais de trinta filmes de sexo explícito com história, pela mitológica produtora Galápagos. Desse total, 11 foram dirigidos por Sternheim (Sexo em Grupo; Variações do Sexo Explícito; Sexo dos Anormais; Sexo Livre; Borboletas e Garanhões; Sexo em Festa; Sexo Doido; Fêmeas que Topam Tudo; Orgasmo Louco; Corpos Quentes; Garotas Sacanas).

Aos 62 anos, Bajon é um homem recluso que vive em sua chácara em Campinas, no interior de São Paulo. Sua vida diária é dedicada a sua criação de cachorros, aos filmes e livros que coleciona. O realizador também continua escrevendo roteiros. “Quero fazer muitos trabalhos. Mas também preciso de tempo para ler Alberto Moravia e não posso deixar de assistir aos trabalhos do Fassbinder”, confessa.

Este personagem especial do cinema brasileiro não dá entrevistas para órgãos de imprensa há décadas. Mesmo assim, abriu uma exceção e conversou por telefone por mais de trinta minutos com a reportagem da Zingu!. Muito educado e afável, nessa entrevista Bajon destaca sua amizade e a parceria de trabalho com Alfredo Sternheim.

Zingu!– Quando foi que o senhor conheceu o Alfredo Sternheim?

Juan Bajon- Eu conheço o Alfredo há muitos anos. Desde os anos 60, quando eu comecei a fazer programação de filmes. Eu lembro bem disso, porque eu era menor na época e o meu pai teve que me emancipar inclusive no cartório. Nessa época, o Alfredinho já era crítico de cinema do Estado de São Paulo. Depois ele passou pela Folha da Tarde.

Z– O que o senhor acha dele como crítico?

JB- São raros os críticos brasileiros que eu respeito. O Alfredo é um deles. Ele sempre falava bem de realizadores que ninguém via ou conhecia. Lembro bem que ele elogiou o Escravos da Coroa, de um realizador subestimado como o Lesley Selander. Nós sempre tivemos uma grande afinidade intelectual e isso acabou nos aproximando. Ele foi uma das poucas pessoas em São Paulo que sempre procurou apoiar os diretores japoneses. Guardo as críticas do Alfredo no Estadão até hoje e tem muita coisa boa. Estou pensando inclusive em organizar tudo e fazer uma exposição mostrando esses textos.

Z– As críticas dele são muito parecidas com as do Biáfora?

JB- Eles são diferentes, embora eles tenham certa semelhança no gosto. Quando eles trabalhavam juntos no Estado de São Paulo, o Alfredo escrevia um número maior de críticas. O Biáfora escrevia somente uma vez por semana. Os dois gostavam muito de cineastas orientais como Nick Naruse, gente que ninguém conhecia. O Alfredo inclusive falava em alguns diretores que o Biáfora não falava. De qualquer maneira, eu nunca concordei 100% com nenhum dos dois, mas isso é normal. Sempre respeitei muito os dois.

Z– O que o senhor acha do Alfredo como realizador?

JB- Olha, pra te ser sincero eu não gosto nem dos meus filmes. Todos nós tivemos que fazer uma série de concessões para que as produções fossem exibidas. Você sempre tinha que colocar um título chamativo e um cartaz apelativo. Mesmo assim, eu sempre achei o Alfredo um diretor acima da média dentro do cinema de São Paulo. Gosto muito do Lucíola e de alguns explícitos como Sexo dos Anormais e Sexo Livre. Também acho aquele filme dele…Mulher Desejada é muito bom. Eu gosto muito do Alfredo, senão não teria chamado ele para trabalhar comigo. Acho que ele é um artesão sério e bastante competente.

Z– Na Galápagos, ele dirigia os filmes e você produzia. Como foi essa parceria?

JB- Ele sempre cumpria tudo que tinha sido combinado comigo. Desde notas, orçamento, datas, prazo. Outros diretores chegaram a me procurar para também trabalhar comigo, mas eu não aceitei. Isso porque o Alfredinho é uma pessoa com uma cultura ampla, você consegue conversar com ele sobre muitos assuntos. Isso não acontece com todo mundo. Sem dúvida, ele tem um nível cultural acima da média. Quando eu chamei ele para trabalhar, ele estava com um pé atrás. Mas depois ele aceitou e fizemos uma série de filmes juntos. Como eu falei antes, ele sempre foi um artesão muito eficiente. Era do tipo de diretor que sabia onde colocava a câmera.

Z– Vocês dois assinaram os filmes explícitos sem pseudônimo. Isso pode ter prejudicado vocês?

JB- Nós fomos os únicos a assumir. Não fomos medrosos ou covardes como os demais. Acho que fomos mais francos com o público.

Z– Todos os filmes que vocês fizeram juntos deram bilheteria?

JB- Todos foram bem e se pagaram. Só tivemos problemas quando lançamos o Borboletas e Garanhões e o Sexo com Chantily. Nessa época, o Jânio Quadros era o prefeito e ele não queria que os cartazes dos filmes ficassem nas portas dos cinemas. Isso nos prejudicou um pouco. Mas depois essa fase passou e continuamos tendo bilheteria.

Z– Desde o final da Galápagos, o Alfredo não fez mais filmes. Na opinião do senhor, por quê isso acontece?

JB- O Alfredo é do tipo de pessoa que não sabe entrar nesses labirintos para conseguir verba. Muitos entraram nesse esquema. Pra te ser sincero, eu acho que esse pessoal do cinema não tem interesse por nada. O Biáfora sempre me falava que era pra eu ter saído do Brasil. Ele tinha razão. Aqui é um lixo. Por exemplo, esses cineastas japoneses que o Alfredo falava nas críticas dele. Os outros críticos nem conheciam. Eu deveria ter ido para os Estados Unidos porque lá sempre te dão algum trabalho digno. É difícil aparecer alguém que queira ousar dentro do cinema brasileiro atual.