Sinhá Moça

Dossiê Vera Cruz

Sinhá Moça
Direção: Tom Payne
Brasil, 1953.

Por Gabriel Carneiro

Sinhá Moça foi o segundo maior sucesso comercial da Vera Cruz, logo atrás de O Cangaceiro, mas não impediu a falência da Companhia. Foi um grande feito, certamente. Levou muita gente aos cinemas e ainda ganhou o prêmio especial do Senado de Berlim, no Festival de Berlim. Mas, talvez seja por se prender a regras que o longa pareça tão fraco e irregular visto quase 60 anos depois. Sinhá Moça ficou datado, sua temática não resistiu ao tempo, e, dessa forma, ficou arrastado e modorrento.

O longa narra a história da abolição da escravatura, no final do século XIX, vista por dois lados da sociedade cafeicultora, os abolicionistas e os senhores de escravos. Pode-se pensar na notabilidade do filme em tratar de tal tema, defendendo o fim da escravidão. De fato, não havia nada similar, ao menos não com tamanha visibilidade e qualidade técnica. Ainda assim, os preconceitos aos negros existem em bom número, além de parecer menosprezar e caricaturar a luta abolicionista e o desejo de liberdade – o escravo, no filme, é o homem cordial, que luta pela soltura, mas não levanta a mão contra o branco, sendo sempre visto de forma enaltecida e vitimada. Se não fosse a existência dos brancos em seus favores, seria uma película, além de maniqueista, segregacionista, mas com os preconceitos velados dos realizadores caucasianos.

Mas não!, há aqueles que são bons e que pregam o humanismo. Eles, e não os negros escravos, são os verdadeiros heróis. É um filme sobre como parte da elite branca foi benevolente, defendendo o trabalho assalariado. Dentro do contexto da Vera Cruz, a história não parece também à toa. É essa mesma elite que vai industrializar São Paulo, mais aceleradamente, nos anos futuros – seja na indústria de base, na de bens de consumo, ou, nos anos 50, na cinematográfica, com a Vera Cruz.

A cargo de Sinhá Moça ficou Tom Payne, o diretor argentino que veio a convite de Alberto Cavalcanti. Payne já havia feito um filme sobre a aristocracia progressista, em 1951, Terra é Sempre Terra – bem superior ao longa em questão -, porém, contemporâneo. O que difere é que o melodrama, lá, diz respeito àquelas pessoas e àquela realidade. Aqui não, há o problema do negro, e mal os vemos. O núcleo central é formado por Eliane Lage, a filha de um cafeicultor extremamente conservador que é a favor da abolição, e por Anselmo Duarte, o filho de um médico, advogado, que não parece se decidir em relação à escravidão. Não levam o país à igualdade social, mas entendem e defendem (até certo ponto) as revoltas e fugas. Seriam, parece, engrenagens do movimento, visto como democratizante. Partes de algo maior, transformados no algo maior – aqueles que libertaram os negros.