Coluna do Biáfora

Filmes de Reichenbach

Textos: Rubem Biáfora

Seleção: Sergio Andrade

A Ilha dos Prazeres Proibidos

“Carlão Reichenbach (moço de sete instrumentos, inclusive aqueles, fortíssimos, de ser ótimo fotógrafo e câmera), dando conta de uma encomenda comercial erótico-comercial do produtor Galante e da empresa Sul-“Ouro”. Bela e perigosa jornalista é enviada à “Ilha dos Prazeres Extremos” a fim de dar cabo de três pessoas: um rebelde político e um casal de refugiados por motivos não muito claros. Carlão adora o cinema tipo deboche. “Udigrudi” (rótulo de mau gosto) como o fazem Julio Bressane, Candeias, Sganzerla (e esta fita ele a realizou pensando na iconoclastia de “A Mulher de Todos”, dirigida pelo último).

O ator Olindo Dias faz o papel de Luc Mollet, na verdade nome de um crítico “nouvelle vague” que dirigiu um filme talvez afim, chamado “Les Contrabandiers”. A atriz Neide Ribeiro parece vulgarmente bonita na tela, mas suas colegas de elenco, Meyre Vieira e Zilda Mayo precisam urgentemente trocar seus clichês “sexy”, uma para papéis como o que Gloria Holden representou no longínquo (1936) “A Filha de Drácula” e outra mais numa linha cômica entre Charlotte (Pernalonga) Greenwood e Betty Garrett. O argentino Carlos Casan já foi ator de Torre-Nilsson, Fernando Ayala e do francês Charles Deray.”

*Publicado originalmente no “O Estado de S. Paulo” de 14/01/77.

***

O Paraíso Proibido

“Empenho narrativo do diretor-autor-iluminador Reichenbach, na mesma linha à William Witney ou Eugene Forde de seu participante “A Ilha dos Prazeres Proibidos”. Mas a rubrica Galante já acostumou e condicionou todo um tipo de exigência de público, já condicionou até as ilações dos títulos de suas produções. E a história e parte da colocação de elenco, talvez colidam com os retoques de fotografia e narração.”

*Publicado originalmente no “O Estado de S. Paulo” de 18/10/81.

***

Amor, Palavra Prostituta

“O cinema de Carlão Reichenbach, num filme que ele e seus colaboradores – Inácio Araujo, Eder Mazzini, Cláudio Cunha, o distribuidor e co-produtor da Brasil Internacional Cinematográfica Alfredo Cohen e parece que também o diretor Jean Garrett – quiseram tão diferente, que procuraram e propalaram bases e ilações no pensamento de Soren Kierkegaard. Isso tudo para contar a história num meio operário de causar espécie e narrar um caso de bitolamento e egoísmo. De certo modo, nada de espantar, pois que a maioria das fitas e a maioria das histórias é sobre os jogos da insensibilidade do mais forte ou mais ambicioso e “pragmático” sobre o sonhador, o boa fé, o desprevenido, o que tem a “divina loucura”. A censura, porém não apreciou muito o enfoque “não habitual” de Carlão, e foi igualmente insensível aos seus acertos, quanto ao corte de ouro de suas enquadrações, sua sem rebuços direção de atores, sua movimentação, ritmo interior e poder de sucessão de imagens. E o filme, anterior a “O Paraíso Proibido”, só foi liberado agora, e parece que não intacto. Patrícia Scalvi é a operária que estranhamente mantém um nefelibata com a catadura rasputinesca de Orlando Parolini. Mas este apesar da catadura a Eduardo Ciannelli & velho Lionel Stander e da cabeleira hippie, tem um lado bom, tão bom que até fez com que Carlão, naquela cena final da compreensão mútua entre Parolini e obrigatoriamente abortiva Alvamar Taddei, lembra em algo o do entendimento e aceitação final entre Monica Vitti e Gabriele Ferzetti no antonionesco “A Aventura”. Quanto a Roberto Miranda, que até então era apenas um ator de profissionalismo para as emergências da “Boca”, aqui marcou um tento: seu papel de empregado “Caxias”, de carreirista, de macho medíocre, de intelecto, deu-lhe uma linha, uma compostura inesperadas que o transformaram agora num intérprete de personalidade. E Patrícia Scalvi é a Margaret O’Brien crescida (no bom sentido), é a Shioban MacKenna, e a irlandesa ou escocesa convicção à Susan Hayward de sempre, mas continua precisando de um filme e um papel à sua medida e só para ela.”

Publicado originalmente no “O Estado de S. Paulo” de 27/03/82.

***

As Safadas

“Resultado de uma lei de obrigatoriedade mal formulada. Filme “rodado” simultaneamente em menos de uma semana, em três episódios e com três diretores (preferivelmente também autores fotógrafos, fazendo câmera ou cenografia e montagem), desimcumbindo-se fustigados da tarefa. As três histórias são obrigatoriamente eróticas, e o mais mencionável é a estréia na direção do montador Inácio Araujo. Na história de Carlão Reichenbach, Zilda Mayo é a “Vamp” dos fliperamas, explorada por um cafetão (Koppa, ótimo, e dando até sentido ao cartaz de publicidade). Na de Inácio, dois casais humildes em desencontro, apesar da ligação puramente física de um deles, acabam descobrindo a compreensão numa troca de parceiros. E na de Toninho Meliande, a amarfanhada Vanessa vai casar com moço quarentão, para poder comprar o enxoval, aconselhada por uma expert resolve ceder até certos limites a lubricidade de três ricos e maduros cavalheiros: Hingst, Dias e Pignatari.”

*Publicado originalmente no “O Estado de S. Paulo” de 09/05/82.