Carta ao leitor.

40 edições. Podemos dizer que é uma vitória a Zingu! chegar ao número 40. Feita de forma completamente independente, com custos arcados pela própria redação, sem retorno financeiro algum, não somos uma revista que tem benefícios. A Zingu! mal consegue uma cabine. Mas, talvez, tenhamos as melhores oportunidades: podemos entrevistar grandes nomes do nosso cinema, alguns no ostracismo, outros não, caso de Francisco Ramalho Jr., o perfilado em dossiê dessa edição.

Ramalho é uma pessoa obstinada. Se, num primeiro momento, não conseguiu viver de cinema, lutou até conseguir. Hoje, sua produtora, Ramalho Filmes, está por trás de filmes de sucesso comercial como O Casamento de Romeu e Julieta (2005) e O Contador de Histórias (2009), além de preparar o retorno de Arnaldo Jabor, após mais de 20 anos afastado, com A Suprema Felicidade. Ramalho é prova de que esse hiato pode ser tranquilamente superado. Ele mesmo, que deixou de dirigir filmes após o fechamento da Embrafilme, voltou em 2006 com Canta Maria e já tem um projeto em pré-produção, América Americana.

Ramalho é uma dessas pessoas de cinema que transitou por diferentes realidades, apesar de ter dirigido apenas 7 longas. Passou pelo cinema paulista dos anos 60, sem uma identidade muito forte, foi para a Boca do Lixo, fez cinema com a Embrafilme e agora conta com as leis de incentivo. Manteve-se ativo produzindo os filmes dos amigos. Em determinado momento da entrevista, ele diz: “Não parei de trabalhar em longa-metragem e me posiciono como exemplo vivo para todos de que é possível se fazer cinema no Brasil”. É verdade, é um exemplo. Independente do que se possa julgar a respeito da qualidade dos filmes, Ramalho faz só cinema há mais de 30 anos. Hoje, com 70, continua nisso, e cada vez mais. Mas até que ponto as pessoas sabem disso? Levam essa afirmação em consideração? Isso já não me parece tão freqüente assim.

Ramalho não carrega em si o culto que muitos cineastas do passado – alguns até que continuam em atividade – possuem, como um Glauber Rocha, um Joaquim Pedro de Andrade, um Roberto Santos, ou mesmo um Carlão Reichenbach – longe de isso ser uma forma de desmerecê-los, claro. Talvez seja a chance de Ramalho ganhar um pouco mais de atenção, especialmente com o livro lançado pela Coleção Aplauso (Francisco Ramalho Jr.: Éramos Apenas Paulistas, de Celso Sabadin), no último ano, e com essa edição da Zingu!.

Já escrevi nesse espaço que a Zingu! se propõe a manter viva a memória de certos personagens de nosso cinema. Todos querem ser lembrados, todos querem crer que fizeram algo que vale a pena não ser esquecido, de que tal obra ou trabalho permanece. É aquela história: as pessoas podem ir, mas suas obras ficam. Que fiquem, que sejam lembrados. A Zingu!, caso seja lembrada, fica, em registro, por sabe-se lá quanto tempo, nem que seja em arquivo, tentando mantê-los na (sua) memória.

Gabriel Carneiro
Editor-chefe da Zingu!
Obs.: Aproveito para anunciar que a edição #40 é minha última edição como editor-chefe. Deixo o cargo, mas não a revista. Passo, assim, o bastão para o grande amigo e pesquisador Adilson Marcelino.
Obs.2: Estreamos a edição #40 após longos meses de reformulação, em especial na parte gráfica. O que chega ao leitor hoje, dia 24/11, é a versão beta – uma versão simples -, que será ainda modificada. A versão alpha, criação de Julia Morena,  será em breve lançada.
Obs.3: Vale falar da nossa enorme alegria ao ser indicado ao Prêmio IBAC – dado pelo Instituto Brasileiro Arte e Cultura -, na categoria cinema, ao lado de grandes nomes, caso do Coletivo Alumbramento e especialmente da Coleção Aplauso.
Obs.4: (atualizado às 0h30 do dia 25/11) É com muita felicidade que anunciamos a vitória da Zingu! no Prêmio IBAC 2010, na categoria cinema. A alegria é enorme. Agradecemos a todos que de alguma forma nos ajudaram a conseguir essa vitória.